Palestrantes sobre reforma trabalhista são unânimes ao dizer que grandes grupos econômicos estão por trás da retirada de direitos – “Quando é que vamos nos convencer que 95% de reprovação não são suficientes para combater 5%? Nós somos a maioria, porém, precisamos nos mobilizar para vencer esta batalha”, foi com esta provocação que o senador Roberto Requião (PMDB) abriu a mesa sobre a Reforma da Trabalhista, na tarde deste sábado (29), durante a 19ª Conferência Nacional dos Bancários.
O pemedebista desmoralizou os gestores de seu partido, que comandam o Brasil atualmente, ao apresentar os caminhos seguidos por importantes economias do mundo, como Estados Unidos, França e Inglaterra- que diante de grandes crises, marcaram fortemente a presença do Estado no processo de recuperação econômica.
Em seguida, citou o Programa Ponte para o Futuro subscrito pelo PSDB. “Essa projeto montado pelos banqueiros e pelo capital internacional foi derrotado por quatro vezes nas urnas. Sem a legitimidade do voto, foi imposto através de um golpe validado pelos poderes da República”, afirmou.
A acidez de sua fala respinga diretamente no presidente ilegítimo. “Tenho pena de Michel Temer que é uma figura medíocre e meramente decorativa, dominada pelos interesses dos bancos Bradesco e Itaú e pelo capital estrangeiro”, ironizou.
E conclui: nós temos uma saída, mas, não é, decididamente, dando guarida ao neoliberalismo moribundo que anda pelo mundo em busca dos países em desenvolvimento para lhe sugar suas riquezas.
Daniella Muradas, professora associada da Faculdade de Direito e Ciências do Estado da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pós-doutora em Sociologia do Trabalho, pelo IFCH da Unicamp, acredita que este é um momento importante para as forças políticas se convergirem e para que renovemos nossas esperanças na luta de classes em busca de um país melhor. “Esse é um golpe global. O Temer é simbólico, o que vem atrás dele é um subjugar de todo um eixo, de toda a topografia do sul ao comando do norte. O objetivo é manter e ampliar a nossa sensação de inferioridade e subalternais, inclusive para reverter eixos migratórios.”
Para a professora-doutora, não há só o intento de achatar as forças humanas, mas também de marcos regulatórios. “A gente tem de se rebelar. Nós, escravos da era moderna, temos que nos unir e nos rebelar às formas jurídicas trabalhistas estabelecidas. Esta reforma é racista e misógina, ela ataca fundamentalmente as mulheres, ela ataca fundamentalmente os jovens e aprofunda as distancias que já temos no Brasil. Esse é um projeto neocolonial.”
Daniella Muradas afirmou que a reforma trabalhista é uma reforma que subverte toda a cultura jurídica trabalhista, conquistada pela classe trabalhadora no início do século passado. “Quando se fala na ruptura da CLT, estamos falando na ruptura de lutas históricas de setores mais organizados, como a categoria dos bancários. Esses trabalhadores foram alijados de todo o processo da reforma e suas lutas históricas foram ignoradas”.
Ela concluiu: “O golpe na classe bancária não é de hoje, o golpe contra os bancários já vem de muito tempo e tem apoio do Judiciário. E agora deram o golpe final, para tornar inacessível o judiciário, para impedir que este sindicalismo, que é um sindicalismo organizado, defenda seus trabalhadores.”
No painel sobre a reforma trabalhista, durante a Conferência Nacional dos Bancários, o técnico e coordenador do Dieese, Clemente Ganz Lucio, defendeu uma nova forma de organização de luta dos trabalhadores para enfrentar os ataques do capital aos direitos trabalhistas.“É preciso reinventar a organização de luta dos trabalhadores. Não podemos mais continuar brigando entre nós, através da desqualificação do outro, mas temos que construir, de fato, a unidade, com uma nova visão estratégica e entender como vamos conduzir as transformações do movimento sindical daqui para frente”, disse.
O economista destacou que o acordo de dois anos da categoria bancária não tem somente a vantagem da questão remuneratória, mas é uma oportunidade para que os sindicalistas reflitam sobre as necessidades de novas formas de conduzir as campanhas salariais.
Mudança global
Segundo o especialista, de 2008 até hoje 95% da riqueza gerada nos EUA foi transferida para 1% da população norte-americana e que metade dos trabalhadores da maior potência econômica do mundo perdeu renda neste período.
“Há uma profunda mudança no padrão de comando da economia e da política no mundo. O neoliberalismo, que significa a subordinação da produção econômica ao interesse do capital financeiro, dos anos 80 para cá, cada vez mais tem gerado formas de transferência para que a riqueza seja canalizada para os bancos e os bancários fazem parte, no trabalho, desta estrutura. É desta desigualdade que estamos tratando neste momento”, acrescenta.
Para Clemente, a conjuntura política e econômica do Brasil faz parte destas transformações do capitalismo mundial e o projeto da reforma trabalhista faz parte deste contexto internacional.
“A mudança no Brasil a partir da deposição da presidenta Dilma Rousseff não é um fenômeno isolado em nosso país, mas representa o padrão econômico que o capital financeiro quer impor no mundo. Os bancos decidiram tomar o comando do poder político”, disse o economista. Lembrou ainda que, em 110 países, foram feitas 642 alterações na legislação trabalhista no mundo. A próxima reforma ocorrerá na França”, afirma.
Ele lembrou ainda que, onde há regulação trabalhista e de negociação forte no mundo, está sendo feita uma mudança na legislação pra reduzir drasticamente o custo do trabalho. “O atual projeto de retirada de direitos não é transitório, mas veio para ficar. Estamos diante de um novo marco regulatório que visa dar total segurança jurídica para as empresas, que visa quebrar o acesso do trabalhador à justiça do trabalho e a toda forma de organização sindical”, afirmou.
Citou como exemplo destas novas regras, a permissão para que os empregados elejam uma comissão com autonomia para negociar com as empresas, eleitos pelos trabalhadores, onde os sindicatos estarão proibidos de intervir. “Querem criar condições para criar a representação dos empregados por empresa e não mais por categoria”, conclui.