Tomaram posse, na quinta feira (28), dois novos integrantes do Conselho de Administração (CA) da Caixa indicados pelo Ministério da Fazenda. Adilson Herrero e Jorge Roberto Manoel são dois legítimos representantes do mercado financeiro e passarão a participar das tomadas de decisão do principal banco público do país, responsável por promover políticas públicas e sociais.
Herrero já exerceu cargo de diretor nas instituições financeiras privadas Banco Real e Banco Alfa. Manoel foi sócio da empresa de auditoria e consultoria britânica PricewaterhouseCoopers – PwC por cerca de 30 anos, até junho de 2016.
Eles ocuparão a função de “conselheiros independentes” no Conselho de Administração da Caixa.
“Resta saber, eles serão independentes de quem?” questiona Dionísio Reis, diretor executivo do Sindicato e coordenador da Comissão Executiva dos Empregados (CEE/Caixa). “Eles são egressos do mercado financeiro e foram indicados pelo Ministério da Fazenda, um órgão capturado pelo mercado financeiro e submetido a um governo federal que não esconde sua intenção de privatizar a Caixa”, afirma Dionísio.
“Se a regulamentação do sistema financeiro não se dá pela Constituição Federal, porque essa possibilidade foi vetada nos debates políticos, ela poderia se dar através dos bancos públicos, como ocorreu em 2012, quando Banco do Brasil e Caixa baixaram os seus juros, obrigando os bancos privados a também diminuírem suas taxas, sob pena de perderem clientes”, lembra o dirigente
Dionísio ressalta que sob o governo Temer, os bancos públicos perderam completamente esse poder. “E com agentes com visão de mercado no CA da Caixa, essa possibilidade ficará anda mais distante. E hoje nós estamos vendo a falta que faz a regulação do sistema financeiro. A taxa Selic é a mais baixa da história, mas os juros cobrados pelos bancos continuam na estratosfera, e não há nenhuma indicação de que serão diminuídos, porque não há qualquer regulação, seja legal; constitucional; via Banco Central; ou via concorrência no mercado, por meio de redução dos juros dos bancos públicos”, avalia Dionísio.
A figura do conselheiro independente no CA da Caixa está prevista na Lei 13.303/2016, a chamada Lei das Estatais.
Resistência à privatização
O projeto de lei original (Projeto de Lei de iniciativa do Senado – PLS 555) ameaçava gravemente a função social das empresas públicas e era muito mais prejudicial à função pública e social das estatais do que o texto que foi aprovado.
Dentre outras medidas, transformaria as empresas públicas em sociedades anônimas, abrindo caminho para que fossem controladas por acionistas que visam primordialmente o lucro; e alteraria a composição acionária das de capital aberto.
Mas diante da intenção mobilização dos trabalhadores, essas medidas foram retiradas do texto. Mesmo com esses avanços, o texto final manteve pontos prejudiciais, como a figura dos conselheiros “independentes” nos conselhos de administração das empresas, e foi sancionado pelo governo Temer (Lei 13.303/2016).
Sabesp e Petrobras
Um exemplo dos danos que a ingerência do mercado financeiro causa nas empresas públicas é a Sabesp. No final de abril, a empresa de saneamento básico do estado de São Paulo – de economia mista – anunciou o pagamento de mais de R$ 700 milhões aos acionistas, na forma de juros de capital próprio.
Ou seja, ao invés de ser destinado para obras de saneamento básico e captação e distribuição de água, parte do dinheiro que a população paga na conta de água acaba no bolso de especuladores financeiros que negociam ações da companhia em Wall Street.
Entre 2003 e 2013, a Sabesp lucrou R$ 13,7 bilhões, dos quais R$ 4,3 bi foram distribuídos aos acionistas. A lei obriga pagamento mínimo de 25% do lucro. Mas no período citado, o governo estadual repassou cerca de um terço do lucro líquido da Sabesp aos acionistas (em 2003, por exemplo, essa porcentagem chegou a 60%). Sobrou, em média, R$ 1,7 bilhão anuais para investimentos no período. O resultado, segundo especialistas, foi a grave crise de abastecimento que afetou o estado de São Paulo em 2014 e 2015.
A política de preços dos combustíveis adotada pela Petrobras que acompanha o valor do petróleo no mercado internacional fez a companhia registrar lucro líquido de R$ 6,96 bilhões no primeiro trimestre de 2018. Por conta disso, a companhia anunciou a antecipação da distribuição de dividendos na forma de juros sobre o capital próprio no valor de R$ 652,2 milhões aos acionistas.
“A lógica de retorno financeiro aos acionistas está sendo implantada nas empresas públicas, e um dos maiores exemplos, que a população brasileira sentiu na pele, foi o que ocorreu na Petrobras, que resultou em aumentos quase semanais nos preços dos combustíveis e levou à greve dos caminhoneiros que afetou toda a sociedade”, resume Dionísio.
Mobilização dá resultados
Uma vitória contra a captura das empresas públicas por agentes do mercado ocorreu após a greve de 72 horas contra a política de preços dos combustíveis deflagrada pelos trabalhadores da Petrobras em maio. A mobilização resultou na renúncia de José Alberto de Paula Torres do Conselho de Administração da empresa. Torres foi um dos mais influentes executivos da Shell, onde trabalhou por 27 anos.
Em outra vitória dos trabalhadores, uma liminar (decisão provisória) obtida pelo movimento sindical no Supremo Tribunal Federal (STF) na quarta-feira 27, impede que o governo venda, sem autorização do Legislativo, o controle acionário de empresas públicas de economia mista, como é o caso do Banco do Brasil, Petrobras e Eletrobras, por exemplo.
Na quinta-feira 5, os trabalhadores realizarão Dia Nacional de Luta em Defesa das Empresas Públicas em diversas cidades do país.