Na maior parte dos casos, a inclusão de critérios socioambientais se restringe a valores elevados de financiamento ou a setores específicos, como a agropecuária. Os Princípios do Equador, por exemplo, que estabelecem diretrizes de crédito sociais e ambientais para instituições financeiras, definem uma linha de corte de US$ 10 milhões para a inclusão de tais critérios no financiamento de projetos de infraestrutura.
Na prática, isso permite que empresas ou projetos considerados irresponsáveis do ponto de vista socioambiental (que utilizem trabalho infantil ou incentivem o desmatamento em áreas protegidas, por exemplo) tomem crédito bancário sem maiores complicações, desde que não enfrentem problemas jurídicos -realidade comum, num país onde boa parte dos órgãos públicos de fiscalização enfrenta problemas de estrutura e de recursos.
Mais do que preocupação com o planeta, a movimentação dos bancos reflete uma apreensão com o futuro de seu próprio negócio, já que os riscos socioambientais aparecem com um potencial de estrago também sobre as instituições.
Segundo o gerente-executivo da Unidade de Desenvolvimento Sustentável do Banco do Brasil, Benílton Couto da Cunha, trata-se de riscos "diretos e indiretos". Ao financiar empreendimentos que venham a gerar impactos socioambientais adversos, os bancos estão submetidos, em primeiro lugar, ao risco de imagem, pela associação de sua marca com o ocorrido, afirma.
E também se submetem ao risco legal, diante da possível corresponsabilização pelo dano causado, e ao risco de inadimplência, já que eventuais multas ou embargos podem repercutir sobre a capacidade do tomador de honrar seus compromissos junto ao banco.
Um exemplo é o caso dos frigoríficos que compravam gado criado em áreas de desmatamento na Amazônia. Após a prática ter sido denunciada pelo Greenpeace e pela ONG Amigos da Terra, em junho do ano passado, grandes redes varejistas suspenderam a compra dos produtos dessas empresas. O resultado foi que alguns desses frigoríficos quase foram à falência e tiveram seus níveis de risco imediatamente reavaliados pelos bancos com quem tinham relações de crédito.
Iniciativas
O esforço dos bancos para compreender e adequar essa nova realidade em seus modelos de risco de crédito inclui uma série de ações. No ano passado, por exemplo, diversos bancos privados assinaram o Protocolo Verde, um documento público no qual assumiram o compromisso de financiar somente empresas e projetos comprometidos com a questão socioambiental. Até então, o Protocolo se restringia a um tímido acordo de intenções entre poucos bancos públicos.
O documento, assinado em conjunto pelo Ministério do Meio Ambiente e a Febraban (Federação Brasileira dos Bancos), estimula não apenas uma análise mais rigorosa dos possíveis impactos sociais e ambientais decorrentes de um financiamento, mas também a diferenciação, inclusive em termos de taxas, para financiamentos e programas que fomentem o desenvolvimento sustentável e a preservação ambiental.
Outra iniciativa é a produção conjunta, sob coordenação do CEBDS (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável), de uma série de relatórios setoriais para avaliar o potencial de estragos e de oportunidades para o sistema financeiro a partir das mudanças climáticas. O primeiro, do setor frigorífico, ficou pronto no início do ano.
"O objetivo é os bancos internalizarem uma prática comum em alguns países lá fora, mas ainda praticamente inexistente por aqui: a avaliação de riscos e oportunidades associadas ao clima em suas análises de crédito", detalha a coordenadora da Câmara Temática de Finanças Sustentáveis do CEBDS, Marina Grossi.
Além de entender os riscos de natureza socioambiental e integrá-los aos modelos de análise de crédito, os bancos ainda têm outro desafio pela frente: usar essas informações para detectar oportunidades.
Por exemplo: identificar segmentos promissores para onde direcionar financiamentos e novos investimentos (como eficiência energética, energia renovável, reflorestamento) ou na criação de produtos de crédito com o apelo desse tipo de política, o que começa a atrair a atenção dos consumidores.
"Esse tema deixou há tempos de ser um debate filosófico. Hoje, é um debate efetivamente de negócios", diz Roland Widmer, coordenador do programa Eco-Finanças, da Amigos da Terra.
Fonte: Folha de São Paulo / André Palhano