Nesta segunda quinzena de outubro o ministro da Economia, Paulo Guedes, voltou a defender a privatização da Caixa – desta vez, com a abertura de capital (IPO) do braço digital do banco “nos próximos seis meses”. No mesmo período, a instituição aprovou a criação de subsidiária da Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários (DTVM), segundo explica nessa entrevista a representante dos trabalhadores do banco no CA, Rita Serrano (foto). Paralelamente, a divulgação de novas pesquisas realizadas pela própria Caixa, pela revista Exame/Instituto Ideia e pela BrandZ (melhores marcas) revela e reafirma a importância do banco público para a sociedade brasileira, que não concorda com sua privatização e vê na marca um sinônimo de acesso democrático ao sistema financeiro. Confira.
Por que a abertura de IPO de um braço digital da Caixa indica nova tentativa de privatização?
Rita Serrano – Com o pagamento do auxílio emergencial, do saque do FGTS, entre outros neste período de pandemia, a Caixa deverá atingir a marca de 100 milhões de contas digitais. Algo que foi feito de forma abrupta, mas revelou o esforço e expertise dos empregados da Caixa. Com isso ela se tornou um dos maiores bancos digitais do mundo. Ainda mais valiosa e fundamental para os brasileiros. Mas o ministro prefere abrir o capital, fazer o IPO, criar subsidiárias e, assim privatizar por segmentos, até que a Caixa deixe de ser o que é: um banco público rentável, competitivo e a serviço dos brasileiros. A criação de subsidiárias é uma forma de burlar a lei que impede a privatização do banco sem aprovação do Congresso Nacional, e está acontecendo também em outras empresas públicas. Na Caixa já se anunciou o interesse em fazer IPOs nas áreas de cartões, loterias e DTVM, além da Caixa Seguridade, que teve a abertura de capital adiada pela segunda vez. O banco digital ainda não existe, mas sua criação e posterior privatização já alertam para a possibilidade de cisão da Caixa, pois não é possível dividir a estrutura operacional da instituição, praticamente todas as operações são digitais; seria o caminho para seu fim.
Houve nova mudança no estatuto da Caixa. O risco de a empresa se tornar S.A. se mantém?
Rita Serrano – Mais uma vez conseguimos nos distanciar deste risco. Obviamente votei contra essa tentativa todas as vezes em que foi colocada, e isso representa uma luta que vem de longe, desde quando iniciamos, no Congresso Nacional, o combate ao projeto de lei 555, o chamado Estatuto das Estatais. No entanto, no âmbito do CA, como representante dos empregados, também propus recentemente que se retirasse do estatuto questões trabalhistas como o Saúde Caixa e a Participação nos Lucros e Resultados (PLR) que, entendo, devem ser discutidas em outros fóruns; sua manutenção indica cerceamento da garantia de livre negociação. Mas infelizmente, novamente fui voto vencido.
A pandemia tem mostrado a importância de empresas e serviços públicos para as sociedades. Na Saúde há o SUS e, entre os bancos, a Caixa é claro exemplo, com milhões passando por ela para poder receber auxílio e milhares de empregados se desdobrando para o atendimento. A população tem essa percepção?
Rita Serrano – Eu acredito que sim. É preciso lembrar que a Caixa sempre foi um banco bem lembrado pelos brasileiros. Está na história do País há muitos anos, é uma ligação secular com o povo. No mês passado uma pesquisa feita pela revista Exame e o Instituto Ideia mostrou que 49% dos brasileiros não querem a privatização da Caixa. E de modo geral os entrevistados se revelaram contrários às privatizações. Também no Senado, por conta da MP 995, que permite privatizar o banco com a criação de subsidiárias, a realização de enquete no portal do Senado na internet mostrou grande rejeição à privatização. A visão da maior parte dos que são ouvidos sobre o tema é de que esta medida provisória desrespeita não apenas a Constituição Federal, mas também o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF).
Do ponto de vista de mercado, e não apenas da sociedade, a Caixa também se destaca como marca, o que representa um capital valioso entre seus pares…
Rita Serrano – Na edição deste ano das marcas mais valiosas do País o ranking BrandZ aponta que dois bancos públicos integram a lista no setor. O Banco do Brasil está na 16ª posição, com um aumento de 29% de valor, e Caixa na 24ª posição, com um aumento de 19% em comparação com o mesmo período do ano passado, sendo que é preciso considerar que o valor total do segmento das instituições financeiras caiu 16% no período. Com isso, como a própria Caixa já divulgou em sua rede de notícias, ela é a terceira marca mais valiosa do Brasil, estimada em US$ 4,838 bilhões, o que representa um acréscimo de US$ 605 milhões no valor da marca. Caixa e BB provam, portanto, que é mentira a afirmação de que eficiência, governança e resultado não são possíveis no setor público.
Então, apesar de todas as iniciativas de privatizar, a Caixa continua bem avaliada e como o banco mais lembrado pelos brasileiros?
Rita Serrano – Sim, pois a tradicional pesquisa feita pela Caixa desde 2008, de monitoramento de imagem, que compara sua atuação com os demais grandes bancos do sistema financeiro, provou mais uma vez sua relevância para o País. Avalio, também, que é reflexo dos debates e campanhas promovidos pelas entidades e empregados na defesa do papel público da instituição. Há dados muito interessantes a destacar, como por exemplo que a Caixa melhorou para 50,8% do público, comparando sua atuação “antes e depois de 2019”; é considerada um banco para todos os perfis nos itens rendas (70,0%), escolaridades (80,0%) e necessidades (79,0%) e o que tem melhor avaliação geral, com média (7,5) melhor que em 2018 (7,3). Além disso o ´elemento síntese´ (da marca, que identifica o produto) e o jingle da instituição ainda são os mais reconhecidos (96% e 76%, respectivamente); é o banco mais importante para a população (64,5%) e com melhores condições de financiamento da casa própria (59,6%).
E nesses tempos de pandemia, o que esses resultados têm a dizer?
Rita Serrano – Ser considerado o banco para todos os perfis e rendas mostra o acesso democrático que só um banco público pode proporcionar, e isso antes mesmo da criação das contas digitais. Com a pandemia, então, isso fica muito, muito mais evidente. Como é evidente a necessidade para o Brasil da manutenção e ampliação desse papel desempenhado pelo Caixa de principal gestora dos programas sociais e dos investimentos em desenvolvimento. Um patrimônio valioso, ativo, e que não pode passar para as mãos de bancos ou empresas privadas. A Caixa é de todos nós, brasileiros, e defendê-la também deve ser uma missão para todos.
Fonte: Rita Serrano / Conselheira de Administração representante dos empregados da Caixa Econômica Federal