Bernanke enfrenta hoje audiência para confirmar seu segundo mandato. Não faz muito tempo, os diretores do Federal Reserve, o banco central americano, estavam certos de que sabiam o que fazer quando vissem bolhas de ações, imóveis e outros ativos: nada.

Agora, ao mesmo tempo em que o presidente do Fed, Ben Bernanke, enfrenta hoje uma audiência no Congresso para confirmar seu segundo mandato de quatro anos, ele e outros no banco estão repensando a abordagem que seguiram nos últimos dez anos. No rastro do estouro da bolha imobiliária e de crédito, Bernanke agora diz que os booms financeiros "talvez sejam o problema mais difícil da política monetária nesta década". Com o valor dos imóveis asiáticos subindo desvairadamente e a cotação do ouro batendo recordes diariamente, esse debate ocorre num momento crucial. Bernanke quer usar seus poderes como regulador bancário para dissolver as bolhas, mas o Comitê Bancário do Senado, que vai questioná-lo esta semana, estuda tirar do Fed seu poder de regulamentação.

Ao mesmo tempo, um projeto de lei na Câmara pode deixar Bernanke no comando de um banco central menos independente. A Comissão de Serviços Financeiros da Câmara aprovou uma lei que deixaria as decisões de política monetária do Fed sob a tutela da Agência de Transparência Governamental, o braço investigativo do Congresso. Bernanke e outros no Fed temem que, sob a tutela do Congresso, qualquer decisão que tomarem sobre os juros tenha de passar pelos ventos políticos – dificultando o controle da inflação ou de bolhas financeiras.

Qualquer mudança deve demorar no mínimo alguns meses e o Fed ainda pode conseguir evitá-la. Enquanto isso, as autoridades continuam desenvolvendo planos para evitar uma nova crise.

Os diretores do Fed costumavam acreditar que havia pouco que deviam ou podiam fazer para evitar o surgimento das bolhas. Um dos motivos é que identificar as bolhas com algum grau de certeza era considerado difícil demais. E, mesmo que elas pudessem ser identificadas com exatidão, estourá-las pode causar mais danos do que benefícios. Aumentar os juros pode deter a bolha, por exemplo, mas também pode diminuir o crescimento em outras partes da economia que estavam sadias.

Assim, a principal estratégia do Fed era limpar a casa depois que a bolha estourava, com juros baixos para suavizar o impacto na economia e reiniciar o crescimento. Essa estratégia foi uma das principais conclusões dos escritos de Bernanke sobre bolhas quando era professor da Universidade de Princeton e novamente quando entrou no Fed, em 2002. Foi uma abordagem abraçada por seu antecessor no comando do Fed, Alan Greenspan.

Agora, as autoridades do Fed admitem que essa fórmula não funcionou. Eles estão buscando alternativas. Dos dois métodos conhecidos para prevenir as bolhas – usar a regulamentação para proteger o sistema financeiro de excessos e mudar a política monetária com aumentos de juros -, Bernanke prefere mais regulamentação, ideia que já defendeu no passado. "A melhor abordagem, se possível, é usar métodos regulatórios e de supervisão para restringir riscos excessivos e garantir que o sistema resistirá caso uma bolha de ativos estoure futuramente", disse Bernanke, em resposta a uma pergunta depois de um discurso em Nova York na semana passada.

Jogar com os juros, por outro lado, é considerado por muitos como uma atitude mais agressiva e arriscada. Na terça-feira, o presidente do Fed da Filadélfia, Charles Plosser, disse que os juros são "um instrumento muito ineficaz" para impedir uma possível bolha. Ele disse que a alta dos juros pode "prejudicar ao mesmo tempo todos os outros preços de ativos".

Mas algumas pessoas na equipe de pesquisa do Fed estão pressionando os diretores do alto escalão a incluir os juros em seus planos – e algumas autoridades dizem que não é mais possível ignorá-los. Kevin Warsh, governador do Fed que passou sete anos em Wall Street antes de ir para Washington, em 2002, diz que está acompanhando de perto os preços de commodities, a cotação do dólar e a movimentação dos mercados de crédito. Ele diz que o Fed precisa ter a mente mais aberta na busca por soluções para as bolhas, inclusive se os juros podem realmente ser usados para dissolvê-las.

Diante do alto desemprego e dos baixos indicadores convencionais de inflação, a grande prioridade do Fed é colocar a economia para andar de novo. O Fed já afirmou que isso implica pelo menos manter os juros baixos ainda por vários meses.

Mas a dúvida sobre a possibilidade e o método de combater as bolhas antes de elas estourarem está se tornando uma preocupação crescente, em meio aos temores de que novas bolhas estão surgindo nos mercados de commodities e nas economia emergentes. A cotação do ouro subiu mais de 50% em um ano. O índice de ações composto de Xangai já subiu quase 80% este ano. A Bovespa, ainda mais. A cotação do petróleo se recuperou. Ela ainda está bem menor que a do auge, no ano passado, mas o retorno dessas altas pode alimentar a inflação dos bens e serviços mais diretamente do que as ações e os imóveis.

"Este momento é muito perigoso", diz Frederic Mishkin, economia da Universidade Columbia e ex-governador do Fed. Se qualquer bolha começar a surgir e o Fed decidir combatê-la mais agressivamente, diz ele, pode prejudicar uma economia já enfraquecida. "Você não quer destruir tudo para encerrar a guerra."

O debate vai muito além do Fed. Pesquisadores do Banco para Compensações Internacionais, um grupo sediado em Basileia, Suíça, que coordena as atividade dos bancos centrais do mundo, vêm pressionando por um combate mais agressivo contra as bolhas. Numa viajem recente à Ásia, Warsh, do Fed, e a presidente do Fed de San Francisco, Janet Yellen, ouviu várias reclamações de autoridades financeiras da China e de Hong Kong, que temem que os baixos juros americanos estejam levando os investidores a tomar empréstimos em dólar para apostar em ativos asiáticos.

O problema dos ativos em valorização – e o que fazer, se é que há algo a fazer – surgiu na reunião de novembro do Fed. As minutas divulgadas na semana passada mostram que as autoridades temem "a possibilidade de que alguns efeitos colaterais negativos surjam da manutenção de juros baixos demais por um período prolongado". Uma preocupação é que houve "complacência excessiva com o risco nos mercados financeiros".

Os diretores do Fed estão debatendo agora as diferenças entre as bolhas, para tentar entendê-las melhor e criar as soluções apropriadas. Dois economistas que estão influenciado o debate são Tobias Adrian, pesquisador do Fed de Nova York, e Hyun Shin, professor de Princeton. O trabalho deles mostra que o estouro da bolha de crédito foi precedido por uma explosão de endividamento de curto prazo por corretoras americanas como o Lehman Brothers e o Bear Stearns.

Daniel Tarullo, o mais novo governador do Fed, está organizando uma nova tropa de choque de analistas, supervisores, advogados e contadores que as autoridades do Fed apelidaram de equipe "de vigilância quantitativa". Eles vão analisar dados sobre as grandes firmas financeiras, buscando riscos ocultos no sistema para que as autoridades possam eliminá-los.

As autoridades bancárias dos EUA, Europa e de outros países estudam regulamentos que obrigariam os bancos a ter uma reserva de capital maior, para desincentivar expansões excessivamente agressivas. Bernanke, por sua vez, quer se proteger de todos os riscos. Se ele achasse que impedir uma bolha com juros mais altos preveniria a alta da inflação ou estabilizar a economia, "teríamos de estudar isso muito seriamente", disse recentemente ao Clube Econômico de Nova York. "Nunca diga nunca."

Fonte: The Wall Street Journal / Jon Hilsenrath

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