Ana Patricia Botín, a filha do chefe, veio ao Reino Unido, onde terá a chance de provar que pode liderar o banco na Espanha que sua família comanda há mais de 60 anos. Com a indicação em novembro como executiva-chefe da unidade do Banco Santander no Reino Unido, Botín tornou-se a mulher mais poderosa no mundo das finanças em Londres.

Se ela puder consertar a reputação de serviços aos clientes do banco e levar a cabo uma oferta pública inicial de ações, terá aumentado as chances de suceder o pai, o presidente do conselho de administração do banco, Emilio Botín, de 76 anos, que tornou o Santander a instituição de crédito mais valiosa da região do euro, após mais de US$ 70 bilhões em aquisições.

Londres será o teste mais duro até hoje para Botín, 50, cujo desempenho é seguido de perto na Espanha, onde a família contribui na administração do banco há 115 anos. Ela assumiu o comando depois do ex-chefe no Reino Unido António Horta-Osório ter deixado o cargo para liderar o rival Lloyds Banking Group Plc.

A oferta inicial foi postergada neste ano e Botín terá de explicar aos investidores que as perspectivas do Santander são sólidas, em um momento no qual há dúvidas sobre o sistema bancário espanhol, segundo avalia o analista Simon Maughan, da MF Global Holdings Ltd., em Londres.

Arquitetar uma oferta inicial não será tarefa fácil para Botín, em cenário de empréstimos hipotecários em queda no Reino Unido, taxas de juros em alta e de recuperação dos maiores rivais, Lloyds e Royal Bank of Scotland Group Plc (RBS), após resgates financeiros.

O banco espanhol pode vender até 25% da unidade no Reino Unido, que inclui o antigo Abbey National, de acordo com uma fonte a par das negociações que não quis ser identificada. A oferta inicial provavelmente ocorrerá no quarto trimestre do ano, segundo Emilio Botín revelou em 3 de fevereiro.

Vender 20% da unidade pode levantar cerca de 4 bilhões de libras esterlinas (US$ 6,5 bilhões), segundo Arturo de Frias, chefe de análises do setor bancário na Evolution Securities Ltd., em Londres. Seria a maior oferta pública inicial no Reino Unido desde que o moscovita VTB Bank OJSC obteve US$ 8 bilhões em maio de 2007.

Ana Botín, que não quis ser entrevistada, terá de resolver a questão da má reputação de serviços aos clientes. O Santander foi chamado de o "banco mais criticado" da Grã-Bretanha em setembro pela revista local "Which?", depois de ter recebido 216.958 queixas, o que significa 8 a cada mil contas, no primeiro semestre de 2010.

Em dezembro, o banco divulgou ter enviado até 35 mil informes com detalhes financeiros de clientes para pessoas erradas no Reino Unido.
Em 18 de janeiro, em comissão na Câmara dos Comuns, Botín disse que o banco contratou mil pessoas para incrementar o serviço no Reino Unido. "Estamos começando a melhorar, mas há muito trabalho a ser feito", afirmou ela.

Botín, que ampliou a concessão para pequenas e médias empresas quando esteve no Banco Español de Crédito SA (Banesto), o braço varejista do Santander que comandou antes de mudar-se a Londres, quer fazer o mesmo no Reino Unido, onde 80% dos negócios do banco são de clientes no varejo, segundo a fonte.

Sua outra meta, disse a gerentes, é aumentar a rentabilidade e a eficiência, enquanto prepara o terreno para a oferta inicial. O lucro da unidade subiu de ? 1,5 bilhão para ? 1,7 bilhão de libras entre 2009 e 2010, anunciou o banco em 3 de fevereiro.

Botín ficou em 38º lugar na lista da revista "Forbes" das mulheres mais poderosas do mundo em 2010, três degraus acima da rainha da Inglaterra.

A executiva é uma das duas mulheres integrantes do conselho de administração, de 20 pessoas, e vem precisando mostrar sua capacidade desde seu primeiro emprego bancário, em Madri, aos 20 anos.

Um de seus primeiros chefes, Martin Benegas, ex-chefe da unidade de empréstimos do J.P. Morgan & Co. em Nova York, disse ter ficado impressionado com ela por ser trabalhadora e saber atuar bem em equipe.

"Foi pura meritocracia e ela chegou por seus próprios méritos", disse Benegas, que a contratou em meados da década de 80 para negociar créditos latino-americanos e agora é sócio da Delphos Investment. "Ela sempre quis fazer o melhor e aperfeiçoar-se."

Mais velha entre seis filhos, ela disse à revista interna do banco em 2005 que nunca considerou se era ou não uma Botín desde que começou no banco em 1988.

O artigo da revista fala de sua criação em uma família "normal", em que ela fazia a própria cama e seu pai às vezes comia sardinhas da própria lata como café da manhã. Sua mãe, Paloma O’Shea, é pianista e patrocinadora de artes.

Na entrevista, ela descreveu como o pai lhe ofereceu o cargo de comando no Banesto, em 2002. "Ele olhou para mim de tal forma que percebi que tinha exatamente dez segundos" para decidir.

Emilio Botín comandou o Santander por 25 anos, transformando-o da sexta maior instituição de crédito da Espanha na primeira, com 179 mil funcionários e ? 1,2 trilhão em ativos, aproximadamente o tamanho de toda a economia espanhola.

Ele é o terceiro membro da família a ser presidente do conselho do Santander, embora os Botín controlem apenas cerca de 2% das ações. Ele tinha 52 anos, dois a mais que sua filha agora, quando sucedeu o pai como presidente do conselho em 1986.

O banco espanhol cresceu em meio à crise financeira, agregando ? 300 bilhões de ativos desde 2007. Depois de comprar o Abbey National em 2004, o Santander expandiu a presença no Reino Unido comprando o Alliance & Leicester Plc e partes do Bradford & Bingley Plc.

Em 2010, comprou mais de 300 agências do RBS, de Edimburgo, chegando a um total de 1,4 mil aproximadamente, abaixo das 2,9 mil do Lloyds.

Botín deixou o Banesto em novembro, com a queda na receita com empréstimos e o aumento nos créditos inadimplentes da crise financeira tendo levado a um declínio de 18% no lucro em 2010, para ? 460 milhões, 5,5% a menos do que quando assumiu o cargo em 2002.

O Banesto faturou ? 1,18 bilhão antes de impostos com a venda, em 2006, de sua participação de 50% na incorporadora Inmobiliaria Urbis SA, um ano antes do colapso do mercado imobiliário espanhol. O retorno sobre o capital, uma medida de rentabilidade, foi de 17,3% quando Botín chegou e de 8,4% quando ela partiu.

"Ele teve um desempenho muito bom", disse Daragh Quinn, analista da Nomura International Plc, em Madrid. "Eles venderam sua empresa imobiliária no auge do ciclo e parecem ter administrado sua exposição ao mercado imobiliário razoavelmente bem. Por outro lado, o Banesto não é uma empresa independente, de modo que isso torna mais difícil julgar seu desempenho individual".

A mudança para Londres abre novas portas para Botin, disse Mauro Guillén, professor de Administração Internacional na Wharton School da Universidade da Pensilvânia, na Filadélfia, e co-autor de uma história do Santander publicada em 2008.

"É muito inteligente, por parte do Santander, ter Ana Patricia Botin na City londrina – francamente, é uma decisão brilhante", disse Guillen. "Ela não apenas aprenderá mais sobre o funcionamento do banco como também construirá algumas relações que serão importantes quando, e se, ela assumir o posto de seu pai".

O marido de Botin, o banqueiro Guillermo Morenes, comprou no ano passado uma casa de seis quartos em Belgravia, um dos bairros mais ricos de Londres, segundo documentos registrados no Registro de Imóveis. Uma propriedade adjacente de tamanho similar foi vendida por mais de 16 milhões de libras em 2009, revelam os registros.

A casa de sete andares faz parte de um conjunto em terraços protegido por portões de segurança e jardins paisagísticos, com estacionamento subterrâneo e um serviço de portaria 18 horas por dia, de acordo com os dados de marketing de outras casas no condomínio fechado. A casa dispõe de quartos para funcionários, um cinema, um elevador e também de uma adega.

Santander pode vender até 25% da unidade no Reino Unido, em oferta inicial que deve ocorrer no 4º trimestre

O nome de Morenes foi para as manchetes em 2008, quando a M&B Capital Advisers, uma corretora que fundou com Javier, irmão de sua esposa, informou ter investido ? 137 milhões fundos de clientes com Bernard Madoff, que está cumprindo uma sentença de 150 anos por ter operado um esquema Ponzi.

Irving Picard, curador da massa falida de Madoff, entrou com uma queixa contra a M&B em dezembro, dizendo que ela ajudou o UBS AG, com sede em Zurique, a encontrar e distribuir um fundo alimentador para o condenado estelionatário. A corretora também estabeleceu seu próprio fundo alimentador que "arrebanhava" novos investidores para Madoff, ao mesmo tempo em que "ganhou milhões em comissões por também ignorar alertas de fraude", segundo a queixa legal.

Morenes recusou-se a comentar para este artigo. Uma porta-voz da empresa de Javier Botín, a JB Capital Markets, que pediu para não ser identificada, em conformidade com a política da empresa, também não quis comentar.

Sua carreira bancária começou imediatamente após a faculdade. Ela trabalhou no J.P. Morgan, hoje parte do J.P. Morgan Chase & Co, primeiro em Madrid e depois em Nova York, tornando-se vice-presidente aos 24 anos. Deixou o J.P. Morgan após oito anos e foi para o Santander a convite de Carlos Garcia, então diretor-geral da divisão internacional do Santander. Ela tornou-se uma diretora do banco no mesmo ano, aos 28 anos de idade.

Fonte: Bloomberg