O Santander foi um dos bancos que mais contribuiu para o fechamento de 1.364 postos de trabalho no primeiro trimestre deste ano, de acordo com a pesquisa de emprego lançada recentemente pela Contraf-CUT em conjunto com o Dieese. Esse procedimento do banco espanhol, motivo de protestos dos bancários e negociações que resultaram na criação do Centro de Realocação Profissional e nos incentivos à aposentadoria para abrir vagas e evitar dispensas, está na contramão das declarações do diretor-geral da Divisão América do Grupo Santander, Francisco Luzón, publicadas em longa reportagem no jornal Valor Econômico desta quarta-feira, dia 8.
"Luzón projetou um cenário de crescimento do emprego na América Latina, mas se esqueceu das demissões de empregados do banco, muitos às vésperas da aposentadoria e com problemas de saúde adquiridos no trabalho", afirma o funcionário do Santander e secretário de imprensa da Contraf-CUT, Ademir Wiederkehr.
O executivo do banco disse que o Brasil foi o país onde o Santander ampliou mais o número de clientes nos últimos cinco anos, o que mostra o potencial do mercado. Para Luzón, "as possibilidades de ‘bancarização’ em um país com 200 milhões de pessoas como o Brasil são enormes e, mesmo com a concorrência forte, vamos ter uma revalorização do sistema financeiro, não só brasileiro como de toda a América Latina".
O diretor da Contraf-CUT frisou que "o banco tem razão ao vislumbrar as perspectivas de crescimento, mas deveria fazer a lição de casa, mantendo os empregos no processo de fusão com o Real". O Santander não tem motivos para demitir. "Estamos abertos para discutir uma política de emprego, que será uma das principais reivindicações da Campanha Salarial dos Bancários de 2009".
O dirigente do Santander anunciou a abertura de novas agências. "Não vamos fechar agências, vamos abrir 400 nos próximos dois anos e expandir nossa rede de atendimento via terminais eletrônicos, postos e internet", revelou Luzón. Segundo ele, o banco no Brasil já tem massa crítica, com 10,5% do mercado brasileiro. "Queremos agora ser o melhor banco do Brasil", prometeu.
"Para ser o melhor banco do Brasil, o Santander tem que parar as demissões, melhorar os salários e as condições de trabalho e voltar a negociar com as entidades sindicais, ao invés de baixar cartilhas com mudanças unilaterais em planos de previdência complementar e de saúde, que trouxeram prejuízos para os funcionários, além de estabelecer uma relação de respeito e valorização dos trabalhadores e dos seus legítimos representantes", concluiu Ademir.
Veja a íntegra da reportagem do Valor Econômico:
Brasil traz a maioria dos clientes ao Santander
Por Angelo Pavini, de Santander, Espanha
Nos próximos três anos, cerca de 20 milhões de pessoas devem entrar no radar dos bancos na América Latina graças à melhora do emprego e da renda dos países da região. A estimativa é de Francisco Luzón, diretor-geral da Divisão América do Grupo Santander, e justifica o interesse da instituição pela região.
O Brasil representa cerca de 40% desse total, o que significaria 8 milhões de novos potenciais clientes. "O fator fundamental é a bancarização. Na Espanha, temos um excesso de capacidade dos bancos, precisamos fechar agências. É diferente do Brasil, onde temos muito espaço para crescer", afirma Luzón.
Os números levam em conta uma projeção de crescimento do emprego na América Latina, com a abertura de 13 milhões de vagas, formais e informais, de 2010 a 2012. Desse total, cerca de 70%são "bancarizáveis", ou seja, serão pessoas com renda suficiente para abrir uma conta ou tomar um empréstimo, o que significaria 10 milhões de pessoas. O efeito multiplicador dos novos empregos e a melhora de renda pelos programas sociais e pela inflação baixa contribuiriam com mais 10 milhões de potenciais clientes.
Segundo o Santander, de 2003 a 2008, 30 milhões de pessoas entraram para a classe média na América Latina – 12 milhões apenas no Brasil -, o que fez o número de pessoas com alguma relação com o banco passar de 60 milhões para 100 milhões. Já as que têm alguma operação de crédito, seja empréstimo, seja cartão de crédito, passaram de 22 milhões para 53 milhões.
Segundo Luzón, o Brasil foi o país onde o Santander ampliou mais o número de clientes nos últimos cinco anos, o que mostra o potencial do mercado. "Por que o Itaú vale 45 bilhões de euros?", pergunta. "É um dos 15 maiores bancos do mundo, e o Bradesco, um dos 20 maiores, e as pessoas viram que Brasil é pais do crescimento, que as possibilidades de bancarização são enormes", diz o executivo.
Com isso, não somente os bancos, mas todo o sistema financeiro brasileiro tem potencial de voltar a crescer acima de 25% ao ano por vários anos quando a crise internacional passar, diz. "As possibilidades de ‘bancarização’ em um país com 200 milhões de pessoas como o Brasil são enormes e, mesmo com a concorrência forte, vamos ter uma revalorização do sistema financeiro, não só brasileiro como de toda a América Latina", avalia o executivo.
O Brasil, diz, tem provavelmente o melhor sistema financeiro entre os países emergentes. "É melhor que a China, onde não se sabe o que está acontecendo claramente com cada instituição pela falta de transparência, melhor que a Rússia, onde o sistema está praticamente quebrado, e mesmo que a Índia", afirma Luzón.
Ele acredita que, nos próximos anos, os bancos brasileiros devem se abrir ao exterior e terão importância na América Latina. "Serão importantes instituições globais nos próximos 10, 15 anos", acredita.
O Brasil é o único país da América Latina onde o crédito continua crescendo apesar da crise mundial, diz Luzón.
No México, por exemplo, onde a economia é mais ligada ao mercado americano, o crescimento é zero. "Já no Brasil, vínhamos, o sistema como um todo, num ritmo de crescimento do crédito de 35% ao ano, agora caiu, mas ainda está acima de 20%, o que é uma grande vantagem", diz.
Luzón considera que a crise foi uma oportunidade para o Santander ganhar espaço no Brasil. "Nos últimos 12 meses, estamos aproveitando o vácuo deixado pelos bancos americanos e europeus, que, pela crise do sistema financeiro nos países desenvolvidos, não têm capacidade de financiamento, não têm liquidez e não conseguem se comprometer quando há um negócio importante com alguma empresa", afirma o executivo. Isso ocorre tanto no Brasil como em outros países da América Latina, como no México e no Chile.
A estratégia proporcionou um forte crescimento da área de atacado do Santander. "Hoje somos líderes nesse segmento de grandes negócios com empresas", diz. Segundo ele, o fato de ser o único banco com rede internacional entre os cinco maiores do país – Banco do Brasil, Itaú Unibanco, Bradesco e Caixa Econômica Federal – é um diferencial que ajuda a atrair as empresas. "É importante para grandes empresas como Petrobras ou Odebrecht nossa presença na América Latina – onde somos líderes -, nos EUA e na Europa", diz.
No segmento de atacado, o Santander quer também participar mais das operações de financiamento de grandes projetos, como os do Plano de Apoio ao Crescimento (PAC) ou de exploração do pré-sal pela Petrobras. Por isso, o banco acredita que o BNDES deveria deixar o setor privado ter uma atuação mais significativa, diz José Paiva Ferreira, vice-presidente do Santander Brasil. "Eventualmente, grande parte desses financiamentos poderiam ter sido feitos pelo setor privado, não seria necessário deixar só o BNDES participar, temos condições de financiar", afirma.
Luzón respeita, porém, o papel dos bancos públicos no sistema financeiro brasileiro. "Sempre estive a favor da estrutura que tem o Brasil, estamos falando de um país importante e caminhando para o desenvolvimento, num processo em que manter dois grandes bancos públicos, BB e Caixa, e mais o BNDES, é uma estratégia acertada", afirma.
Para Luzón, é bom ter bancos públicos, assim como fez a Espanha até 1988, devido ao papel de apoio ao sistema financeiro e ao desenvolvimento. "Mas é fundamental que a forma de trabalhar dos bancos públicos seja a livre concorrência, que eles não tenham vantagens especiais", diz. Luzón foi presidente do Banco Argentária, que reuniu todos os bancos públicos espanhóis para sua posterior privatização.
Sobre o uso dos bancos públicos para forçar a redução dos spreads bancários, Luzón reconhece o esforço do governo em manter o setor financeiro competitivo. "Mas a redução das margens dos empréstimos está ligada a muitos fatores, não só do setor financeiro, como por exemplo o peso do setor público na economia", afirma. Além disso, é um processo que, como a queda dos juros nominais, vai levar anos, provavelmente quando país alcançar o estágio de economia desenvolvida. "E eu acredito que o Brasil será um país desenvolvido nos próximos dez anos", afirma.
Ele observa que o Brasil cresceu em média 5% ao ano nos últimos três anos. "Aí veio a crise e o Brasil é um dos únicos países do mundo que vai sair dela sem uma recessão", afirma ele, que estima um crescimento do PIB para este ano entre zero e 0,5%. "Mas o importante é que todos acham que o Brasil vai crescer 3,5%, 4% em 2010, o que mostra que o país está no caminho do desenvolvimento". Ele admite, porém, que há problemas a resolver, especialmente na parte fiscal.
"O Brasil sabe que tem problema de eficiência no gasto público, é o único na América Latina onde a arrecadação é de 40% do PIB e tem pouca eficiência no gasto", diz. "Mas o país está em uma boa direção e vai sair fortalecido da crise." Para isso, porém, será preciso continuar as reformas estruturais e, segundo Luzón, não olhar para trás. "Não há atalhos para o desenvolvimento, nenhum país conseguiu chegar a ele por caminhos populistas ou heterodoxos", diz. O importante é continuar crescendo, distribuindo renda e investindo em educação e nas instituições.
Luzón diz que o banco não pretende fazer novas aquisições no médio prazo, uma vez que a instituição está ainda digerindo as compras do Banco Real no Brasil e de bancos nos Estados Unidos, Reino Unido e Alemanha. O processo de integração do Real deverá estar concluído até o fim de 2010, quando então será definido se a marca vai ser mantida ou substituída pela do Santander.
"Mas estamos fazendo as coisas com calma, não vamos fechar agências, vamos abrir 400 nos próximos dois anos e expandir nossa rede de atendimento via terminais eletrônicos, postos e internet", afirma Luzón. Segundo ele, o banco no Brasil já tem massa crítica, com 10,5% do mercado brasileiro. "Queremos agora ser o melhor banco do Brasil", diz.
Fonte: Jornal Valor Econômico