Para os britânicos, os grandes grupos econômicos prestam serviço de má qualidade, ignoram as necessidades dos consumidores e priorizam, apenas, o envio de lucros exorbitantes aos seus acionistas.
Integrante da Internacional de Serviços Públicos (ISP) e secretária da Mulher Trabalhadora da CUT, Junéia Batista, considera a avaliação negativa dos britânicos absolutamente correta. Segundo ela, em todo o mundo, “as privatizações repassam as riquezas naturais para os grupos internacionais que, em contrapartida, devolvem péssimos serviços para a população”.
No caso britânico, o relatório da empresa Cuttil, que fez a pesquisa sobre os serviços privatizados, mostrou que, com as taxas atuais de investimentos, a empresa privada de água e saneamento, por exemplo, levará 357 anos para renovar a rede de abastecimento de Londres, enquanto no Japão o processo levaria apenas 10 anos.
E foi justamente esse modelo de privatização que mercantiliza os serviços públicos reprovado pela maioria dos britânicos que inspirou o governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB-SP) a iniciar um processo de privatização no Brasil na década de 1990 e que, agora, o ilegítimo Michel Temer (MDB-SP) quer ampliar, diz Felipe Araújo, engenheiro civil da Eletrobras/Furnas e diretor da Associação dos Funcionários de Furnas (ASEF).
“Foi exatamente da Grã-Bretanha que o governo FHC trouxe o modelo de privatização e mercantilização do setor elétrico brasileiro e agora o governo Temer busca aprofundar sem a devida discussão técnica, desconsiderando importantes exemplos mundiais, como a realidade britânica”, diz Felipe.
As empresas privadas têm interesses e visam lucro a curto-prazo, enquanto uma empresa estatal tem de ter cuidado com o bem público
Para o coordenador da Federação Única dos Petroleiros (FUP), José Maria RangeI, o Brasil está na contramão da história.
“Enquanto o mundo estatiza os serviços essenciais para a população, o Brasil privatiza tudo porque há no poder hoje um governo usurpador e sem compromisso com a sociedade”.
O secretário de Meio Ambiente da CUT, Daniel Gaio, alerta para o risco da privatização da Eletrobras e as consequências da venda do patrimônio público não apenas para o sistema elétrico, mas também para o controle da água, que passará a ter um preço definido pelas empresas privadas, uma vez que parte considerável da energia gerada no País vem das hidrelétricas.
“As empresas que estão por trás disso não querem a privatização apenas pelo valor da tarifa dos serviços e sim pelo domínio dos bens naturais”, afirma Daniel.
Segundo ele, esse governo golpista e sua política neoliberal quer privatizar bens públicos e ainda por cima colocar preços – mercantilizar – os bens públicos.
O secretário de Meio Ambiente da CUT alerta ainda para um Projeto de Lei (PL) que está tramitando na Câmara dos Deputados – que pode ser alterado para Medida Provisória (MP) – que incentiva a privatização dos serviços municipais da água, incluindo o saneamento.
Pelo PL, o município fica obrigado a oferecer suas companhias de água para o setor privado e se não conseguir interessados, aí sim poderia oferecer as empresas estaduais, como a Sabesp, por exemplo.
“Há uma pressão das grandes empresas que financiam as campanhas eleitorais para aprovação desse projeto que facilita e incentiva os municípios a privatizarem a água”, conta Daniel Gaio.
Educação e saúde
O engenheiro Felipe Araújo, diretor da Associação dos Funcionários de Furnas (ASEF), alerta para outro ponto, o falso argumento dos golpistas de que a venda das estatais gerará receita para a saúde e a educação, com o pagamento de impostos.
Felipe lembra que o teto dos gastos públicos impede a utilização desses recursos, e, além disso, as grandes empresas enviam seus lucros para os países onde elas pagam menos impostos.
Desestatização no mundo
O processo de reestatização dos serviços públicos também é apoiado pela população da Argentina, Estados Unidos, França e outros países da Europa.
No ano 2000, os franceses quiseram a volta da estatização da água, e mais recentemente, Buenos Ayres e outras cidades argentinas querem a ‘desprivatização ’ desse serviço.
Margaret Thatcher X Sindicalistas
Uma das mais polêmicas lutas contra o processo de privatização no Reino Unido, ocorreu quando a então primeira-ministra Margaret Thatcher comprou briga com os mineiros de carvão em violentos protestos envolvendo trabalhadores e as forças policiais.
Em 1984, após quatro meses de greve dos mineiros, Thatcher mantinha uma postura irredutível em relação às exigências dos mineiros, que protestavam contra o encerramento de dezenas de minas.
A greve, marcada por vários confrontos violentos entre a polícia e os piquetes, só terminou no ano seguinte, em que foram fechadas diversas minas de carvão. As que sobreviveram foram privatizadas, mas ao longo do tempo acabaram também fechadas.
O poder dos sindicatos se quebrou, dezenas de milhares de trabalhadores perderam seus empregos e a produção de 130 milhões de toneladas ao ano de carvão caiu para 17 milhões de toneladas.
Os setores da economia que dependiam do carvão, como as usinas elétricas, passaram a comprar o produto importado mais barato.
Assim, o Reino Unido se tornou a “Meca” das privatizações em que a visão socialista cedeu para a era de individualismo.