Para esclarecer essas dúvidas é preciso primeiro compreender como funciona o modelo de custeio do Saúde Caixa, que difere de todos os outros planos de autogestão existentes. Normalmente, as empresas patrocinadoras estabelecem um limite para sua contribuição, cujo valor corresponde há um percentual da folha de pagamento. Como o índice de referência para os reajustes salariais é o INPC, a empresa começa a transferir os custos para os empregados quando o teto estabelecido é atingido, pois os aumentos dos custos de saúde, a chamada inflação médica, é sempre superior ao INPC.
Para evitar esse problema, o modelo negociado com a Caixa em 2003 e implantado em 2004 buscou romper essa lógica. No nosso plano de saúde, a contribuição das partes (empregados e Caixa) é estabelecida percentualmente a partir do valor projetado dos custos assistenciais para o exercício que se inicia. A proporção, negociada em 2003 e mantida até hoje, foi de 70% para a Caixa e 30% para os empregados, sendo os demais custos arcados 100% pela patrocinadora.
Os 30% que cabem aos empregados são aportados mês a mês por meio das mensalidades (2% da remuneração base) e das coparticipações de 20% sobre o valor do procedimento, limitado a R$ 2.400,00 anuais. Já o aporte da Caixa se dá complementando o valor depositado pelos empregados, na medida em que o banco paga as faturas apresentadas pela rede credenciada, reembolsando os empregados quando se trata de livre escolha.
Como o custo assistencial é obtido por meio de projeção atuarial, o valor é aproximado, e é normal que haja um pequeno desequilíbrio na proporção. Esse desequilíbrio é aferido ao final do exercício e o devido ajuste é feito. Caso a contribuição dos empregados fique abaixo dos 30%, essa diferença será cobrada no exercício seguinte, parcelada ao longo dos doze meses, a fim de restabelecer o equilíbrio. Porém, se ocorrer o contrário e os empregados aportarem, durante o ano, um valor superior aos 30%, a Caixa deve, ao final, aportar a diferença de modo a recompor a proporção prevista (70% X 30%). É ao fazer essa recomposição que surge o superávit.
A projeção atuarial realizada em determinado ano pode indicar que, mesmo havendo superávit, haja necessidade de ser aplicado algum reajuste nos itens de custeio, pois o superávit não pode ser usado para suprir essa diferença, pois será consumido e no próximo exercício terá de se aplicar um reajuste ainda maior.
A atribuição de propor o reajuste para o exercício seguinte, então, é do Conselho de Usuários, formado por cinco representantes eleitos pelos usuários do plano e cinco indicados pela Caixa. A análise dos números é feita pelo Conselho em uma reunião ordinária realizada no final do exercício vigente. Ocorre que o Conselho não é deliberativo, mas apenas consultivo, e a Caixa pode aplicar reajuste diferente do proposto.
Foi exatamente o que ocorreu nos exercícios de 2006 e 2007. A empresa, desconsiderando a orientação dos conselheiros eleitos, aplicou reajustes acima da necessidade, elevando o teto de coparticipação em 100% nesses dois anos. Isso gerou uma arrecadação tão superior ao necessário que, a partir de 2008, não foi aplicado mais nenhum novo reajuste.
“A Caixa percebeu o erro, mas não diminuiu o valor da contribuição, mantendo a arrecadação muito acima do necessário. O resultado disso é que, mesmo com a inflação médica aumentando o custo do plano todos os anos, os empregados pagam tanto a mais que, até hoje, sobra dinheiro”, explica a diretora de Saúde e Previdência da Fenae, Fabiana Matheus. “Agora, querem compensar os resultados insatisfatórios do banco à custa dos empregados, sacrificando direitos trabalhistas duramente conquistados. Não podemos permitir”, acrescenta.
Qual o tamanho do superávit?
De acordo com os relatórios financeiros de 2015 e 2016 fornecidos pela Caixa, o superávit já ultrapassava os R$ 670 milhões, equivalente a 51% do custo de um exercício inteiro. Como até hoje a Caixa não cumpriu o compromisso de registrar contabilmente o fundo de forma segregada, o valor do superávit é apropriado indevidamente pelo banco, fazendo com que o componha o resultado/lucro anual da empresa.
Mas a pior notícia, no entanto, é que a Caixa, mediante alteração de seu estatuto, pretende estabelecer um teto anual de 6,5% da folha de pagamento para a sua participação, incluindo aí os gastos não assistenciais, que hoje são arcados integralmente por ela. Isso irá, com o passar dos anos, inviabilizar o Saúde Caixa.
“Por isso essa imposição de aumentos aos empregados de forma unilateral é ainda mais absurda. Fixar a contribuição à folha de pagamento vai inviabilizar o nosso plano no médio prazo, já que o INPC – índice de preços ao consumidor, usado como referência para os reajustes salariais – sobe num ritmo muito mais lento do que a inflação médica. É o que tem acontecido com outros planos, e o que não podemos permitir com o Saúde Caixa”, alerta o coordenador da CEE/Caixa e diretor da Fenae, Dionísio Reis.
Caixa não divulga os números de 2017
Os relatórios do exercício de 2017, que deveriam ter sido apresentados na reunião do Conselho realizada no dia 13 de dezembro, até o momento não foram apresentados, em descumprimento ao ACT. Portanto, ainda não se sabe se haverá necessidade de reajuste em 2018. Segundo os representantes da Caixa na época, o processo de contratação da empresa responsável por fazer a avaliação atuarial ainda nem sequer havia sido concluído.
“A falta de informação sobre os números atualizados compromete a elaboração das projeções necessárias e dificulta a consolidação de um parecer do Conselho. O amadorismo demonstrado pela Caixa na gestão do plano torna o acompanhamento muito mais difícil. As inconsistências nas bases de dados impedem uma análise criteriosa e tempestiva, podendo comprometer a sustentabilidade do Saúde Caixa”, critica a conselheira eleita e diretora da Apcef/SP, Ivanilde Moreira. Segundo informes da Caixa, a contratação da consultoria para realização do cálculo atuarial estará concluída, provavelmente, neste mês.
Mobilização ganha força
Um movimento espontâneo surgido entre os usuários do Saúde Caixa está ganhando força. Um abaixo assinado virtual promovido pela aposentada Elisabete Moreira, de Sorocaba (SP), já reuniu mais de 17 mil assinaturas pedindo a manutenção do modelo de custeio e a agilização no atendimento das demandas dos usuários na central de atendimento. A iniciativa se soma à defesa que a Fenae vem fazendo nas redes sociais e na Justiça.