O microcrédito começa a mudar de perfil, com crescimento mais forte no financiamento de pequenos negócios e desaceleração nas operações dirigidas ao consumo, mostram estatísticas divulgadas pelo Banco Central. Baixa inadimplência e forte demanda por recursos explicam a preferência das instituições financeiras por emprestar para os pequenos empreendedores.
Os empréstimos para atividades produtivas cresceram 45% nos 12 meses encerrados em abril, chegando a R$ 530 milhões, segundo dados do BC sobre o direcionamento de recursos captados pelos bancos em contas correntes para operações de microcrédito. No mesmo período, os financiamentos ao consumo encolheram 8%, caindo a R$ 879 milhões em abril.
Com isso, os financiamentos a atividades produtivas passaram a representar 38% do microcrédito, bem acima dos 27% observados em abril de 2007. Na direção inversa, a participação dos financiamentos ao consumo decresceu de 73% para 62%.
"A crise financeira não prejudicou em nada o microcrédito produtivo", afirma o coordenador do programa do microcrédito do Ministério do Trabalho, Max Brito Coelho. "A demanda por crédito segue forte, e a inadimplência continua sob controle."
Desde 2004, os bancos estão obrigados a destinar 2% dos recursos captados em contas correntes a operações de microcrédito. As taxas são limitadas, de forma geral, a 2% ao mês, e o valor máximo dos empréstimos a pessoas físicas é de R$ 2 mil. Nos financiamento de microempreendedores, o teto é de R$ 15 mil.
Em junho, os bancos cumpriram apenas 57% das exigências de aplicação em microcrédito. Os empréstimos somavam R$ 1,383 bilhão, enquanto, pela legislação, os bancos deveriam aplicar R$ 2,428 bilhões. Quando ficam abaixo do exigido, os bancos são punidos com recolhimento dos recursos não aplicados ao Banco Central, sem receber remuneração.
Quando o direcionamento de recursos ao microcrédito foi criado, em 2004, os bancos destinaram recursos sobretudo para o financiamento do consumo, que são mais fáceis de contratar. Em setembro de 2005, essas aplicações chegaram ao pico de R$ 1,069 bilhão, ou 85% das operações de microcrédito contratadas. A alta inadimplência fez com que, de lá para cá, os bancos diminuíssem suas carteiras.
Não há dados agregados sobre a inadimplência das carteiras de microcrédito do sistema financeiro. No Banco Popular do Brasil, braço do Banco do Brasil para o segmento de microfinanças, esse índice chegou a 35%. Medidas tomadas desde então reduziram o percentual para 17,5%. A Caixa Econômica Federal não revela a inadimplência no microcrédito, mas reconhece que é alguns pontos superior à média da carteira de crédito como um todo.
No microcrédito produtivo, a inadimplência é menor, graças ao sistema de agentes de crédito, que assessoram os empreendedores que tomam empréstimos. No Banco do Nordeste (BNB), que tem a maior carteira de microcrédito produtivo do mercado, com R$ 400,3 milhões em junho, a inadimplência é de 1,44%.
O próprio BNB é um dos principais responsáveis pelo aumento do microcrédito produtivo, com expansão de 55% de sua carteira em 2008 e de 10% nos seis primeiros meses de 2009. "A crise não chegou ao setor informal", afirma Stélio Gama, superintendente de microfinanças do BNB. O BNB não apenas cumpre suas exigências de aplicação de recursos, como ajuda outros bancos a cumprir, ao captar recursos por meio de depósitos interfinanceiros de microfinanças.
No BB, a aposta é associar o microcrédito ao programa Desenvolvimento Regional Sustentável (DRS), com planos de emprestar entre R$ 100 milhões e R$ 200 milhões nos próximos anos. "Estamos ainda numa curva de aprendizado, mas nossa aposta é que conseguiremos baixos níveis de inadimplência", afirma a diretora de menor renda do BB, Izabela de Alcantara Lemos.
Já a Caixa aposta em convênios com prefeituras e na sua rede de correspondentes bancários para expandir o microcrédito produtivo. "A demanda existe e se manteve forte mesmo na crise", afirma o superintendente de clientes renda básica da Caixa, Milton Kruger.
Fonte: Valor Econômico / Alex Ribeiro