Desemprego e inflação reduzem o bem-estar das pessoas, mas o impacto da desocupação é bem mais forte – quase quatro vezes maior que o do aumento dos índices de preços. “O desemprego tende a ser uma preocupação não apenas para os próprios desempregados, mas também para a família, amigos e para os que estão empregados, que ficam preocupados com a possibilidade de serem demitidos”, afirma o estudo que chegou a essas conclusões, realizado com base em pesquisas qualitativas com mais de 1 milhão de europeus entre 1975 e 2012.

“Em todas as equações de felicidade, o desemprego tem um grande impacto sobre o bem-estar”, disse ao Valor o professor David Blanchflower, da Universidade de Dartmouth, nos Estados Unidos, e da Universidade de Stirling, no Reino Unido, autor do trabalho com outros três economistas.

Apresentado por Blanchflower num seminário do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) em abril, o estudo mostra que um aumento de 1 ponto percentual na taxa de desemprego reduz o bem-estar quase quatro vezes mais do que uma alta equivalente da inflação.

“Excluindo os cinco principais países da zona do euro que são especialmente preocupados com a inflação – Alemanha, Áustria, França, Finlândia e Áustria, essa proporção chega a seis vezes”.

Ao comentar a atual situação econômica da Europa, Blanchflower não poupou críticas ao Banco Central Europeu (BCE). Para ele, a instituição não reage como deveria à elevadíssima desocupação na zona do euro. “A Europa está em recessão, não há inflação e o desemprego está em dois dígitos, mas o que os lunáticos estão fazendo?”, disse ele, criticando a decisão do BCE de manter os juros em 0,5% ao ano na reunião da semana passada.

“Eles estão condenando toda uma geração”, afirmou Blanchflower, referindo-se às taxas estratosféricas de desocupação entre os mais jovens em alguns países da Europa – superior a 60% na Grécia, na casa de 56% na Espanha e acima de 40% tanto na Itália quanto em Portugal.

Membro do Comitê de Política Monetária do Banco da Inglaterra entre 2006 e 2009, Blanchflower elogiou o Fed o Banco do Japão (BoJ, na sigla em inglês, o banco central japonês), que têm adotado uma política monetária ultra agressiva, com juros no chão e injeções maciças de dinheiro na economia. O Fed compra mensalmente US$ 85 bilhões de títulos públicos de papéis lastreados em hipotecas, para manter baixas as taxas de longo prazo. Blanchflower vê o Banco da Inglaterra numa posição intermediária – o desempenho é melhor do que o dos “lunáticos” do BCE, mas deixa a desejar em relação ao Fed e ao Banco do Japão.

Economista especializado em assuntos do mercado de trabalho, Blanchflower disse que hoje o Fed opera com a meta de reduzir o desemprego, ainda que o seu mandato seja duplo – alcançar o máximo nível de emprego e manter a estabilidade de preços.

Em dezembro, a instituição anunciou que vai manter os juros baixos enquanto a desocupação não cair abaixo de 6,5% e as expectativas de inflação de um a dois anos não superarem 2,5%. Com a taxa de desemprego de maio em 7,6%, um número ainda elevado, e a inflação ao consumidor na casa de 1% no acumulado em 12 meses, dar prioridade ao combate ao desemprego é sem dúvida a política adequada, segundo Blanchflower.

E faz sentido aumentar juros no Brasil, que está em pleno emprego ou próximo disso, com inflação próxima do teto da meta, de 6,5%, mas num ambiente global de juros baixíssimos? “Se você tem pleno emprego, há muito poucas alternativas a um aumento dos juros. Se o mercado de trabalho está apertado e há inflação causada por salários, é razoável elevar as taxas”, disse Blanchflower. É uma situação totalmente diferente da enfrentada pelos países desenvolvidos.

Intitulado “Os efeitos dos choques macroeconômicos sobre o bem-estar”, o estudo mostra ainda que o desemprego incomoda mais as mulheres do que os homens. “Os menos educados, os casados, viúvos e os mais velhos são mais preocupados com o desemprego. Ao mesmo tempo, os mais jovens e os mais educados colocam mais peso na inflação”, nota o trabalho, observando que isso vai contra a ideia de que os mais velhos se preocupariam mais com a inflação, por ser mais provável que tenham experimentado vários períodos marcados por altos índices de preços.

Uma possível explicação, segundo explicam os autores do estudo, é que as pessoas de mais idade tenham vivenciado o desemprego e compreendido as suas consequências duradouras. Ficar sem emprego por muito tempo prejudica muito o bem-estar, e é algo que tende a afetar especialmente essa camada da população.

Fonte: Valor Econômico / Sergio Lamucci