Na condição de presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), o economista Demian Fiocca assinou contrato para a concessão de uma carteira de crédito ao HSBC, numa operação que fez com que o banco federal de fomento abrisse mão de créditos de aproximadamente R$ 642 milhões. Fiocca havia sido economista-chefe do HSBC entre 1998 e 2000.
Conforme a Folha publicou no domingo, o BNDES vendeu para o HSBC por R$ 8,3 milhões, em fevereiro de 2007, uma carteira avaliada em R$ 650 milhões.
Pelo BNDES, além de Fiocca também assinaram o contrato os diretores Elvio Lima Gaspar e Maurício Borges Lemos. Por meio de sua assessoria, o BNDES ressaltou que a decisão de venda da carteira para o HSBC foi tomada por unanimidade pela diretoria colegiada do banco.
Hoje diretor-executivo da mineradora Vale, Fiocca não quis se manifestar por entender que as explicações técnicas da operação deveriam ser prestadas pelo BNDES – que negou quaisquer irregularidades na decisão.
Ontem, um engenheiro do Paraná, Antônio José Vellozo, entrou com uma ação popular na Justiça pedindo a anulação da operação entre o BNDES e o HSBC e solicitando que o Ministério Público Federal investigue o caso.
O senador paranaense Álvaro Dias (PSDB), por sua vez, afirmou que apresentará à Mesa do Senado requerimento para que o Tribunal de Contas da União faça uma auditoria na transação.
A operação entre o BNDES e o HSBC começou em março de 1997, após intervenção do Banco Central no banco paranaense Bamerindus.
O HSBC comprou a chamada "parte boa" da instituição. Mas a carteira de créditos do Bamerindus da linha Finame voltou para o BNDES.
Contudo, em vez de o próprio BNDES cobrar as dívidas ou realizar leilão para receber o maior valor possível pela carteira, incumbiu o HSBC de recuperar os créditos e repassar os recursos ao banco estatal.
Não foi possível precisar o quanto exatamente o banco estatal deixou de embolsar na transação porque o BNDES não manteve uma contabilidade dos recursos recebidos do HSBC nem sequer formalizou em contrato a transferência da cobrança dos créditos.
Pela falta de controle em relação a essas operações, o BNDES afirmou não saber informar o total dos créditos assumidos pelo banco privado em fevereiro de 2007.
A conta feita pelo BNDES para apurar o valor da carteira vendida foi muito favorável ao HSBC. Para corrigir o total da carteira, o BNDES aplicou TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo) mais 0,5% ao ano, chegando a R$ 1,649 bilhão.
De outro lado, o BNDES somou os pagamentos feitos pelo HSBC e corrigiu os valores pela Selic (taxa básica de juros da economia), historicamente muito superior à TJLP mais 0,5%. Por esse cálculo, o HSBC teria repassado ao BNDES R$ 1,641 bilhão. Pela diferença, R$ 8,3 milhões, o HSBC levou todo o restante da carteira.
BNDES nega conflito de interesses
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O BNDES informou, por meio de sua assessoria, que o presidente do banco não tem alçada para aprovar sozinho uma transação como a venda de carteira de crédito.
"A decisão da diretoria [colegiada] do BNDES de celebrar o contrato com o HSBC seguiu estritamente a orientação da área técnica do banco, após aprovação do comitê de crédito, sem que a diretoria fizesse alterações à proposta", informou a assessoria do BNDES.
"A área técnica e o comitê de crédito são compostos em sua totalidade por funcionários de carreira do banco", completou. O BNDES descartou a possibilidade de conflito de interesse, ressaltando que Fiocca havia deixado o HSBC seis anos antes de ingressar no banco estatal, "tendo decorrido período de quarentena de praxe no mercado".
Por meio de sua assessoria, o HSBC informou que a operação com o BNDES foi lícita e que Fiocca exerceu seu cargo quando esteve no banco (entre 1998 e 2000) com "total probidade profissional".
Fonte: Folha de São Paulo/ Leonardo Souza