Com o país sob pressão cada vez maior dos vizinhos e dos Estados Unidos, o presidente da Suíça já admite mudanças no seu polêmico sigilo bancário. Hanz Rudolf Merz disse ontem que o governo nomeou uma comissão de especialistas para estudar reformas que tornem o sistema aceitável por outros países.

Mas, seguindo a tradição política helvética de proteger o principal chamariz de trilhões do mundo inteiro, Merz defendeu o sigilo bancário como parte da "mentalidade suíça" e disse que ele ficará "intacto".

Os comentários de Merz, numa disputada entrevista em Genebra, foram feitos um dia após o Senado dos EUA advertir que continuará pressionando o UBS a romper o sigilo.

O maior banco da Suíça foi forçado pela Justiça dos EUA a pagar multa de US$ 780 milhões e revelar informações de cerca de 200 clientes americanos. Mas as autoridades fiscais americanas mantêm a batalha legal para obter dados sobre outras 52 mil contas no UBS, em que calculam haver US$ 14,8 bilhões de americanos.

Diante de tanta pressão, Merz admitiu ontem que a Suíça terá que fazer concessões. Uma possibilidade, que o presidente disse ser a sua preferida, seria vincular o sigilo bancário a um imposto. Merz, que também é ministro das Finanças, não entrou em detalhes sobre essa e outras ideias em estudo.

"O Conselho Federal está considerando a questão de diferenciar entre evasão e fraude fiscal", disse Merz, acrescentando que a Suíça está disposta a negociar outras concessões.

O sigilo bancário faz parte da Constituição da Suíça, e os bancos do país são proibidos de revelar dados sobre seus clientes, a menos que haja suspeita de atividade criminosa. De acordo com a lei do país, evasão fiscal não é crime, mas uma contravenção punível com multa.

Questionado sobre casos de banqueiros suíços presos ao facilitarem a sonegação, como ocorreu no Brasil, Merz não quis polêmica. "Essa não é uma questão política, mas jurídica", disse o presidente. "O Brasil é um Estado de Direito e tem capacidade para lidar com casos em que a lei é desrespeitada."

Merz disse, porém, que aprova a ideia de estender a outros países, incluindo o Brasil, acordo feito com a União Europeia em 2004, após outra onda de pressões contra o sigilo bancário. O acordo prevê, por exemplo, a cobrança de impostos das contas secretas na fonte.

Nesta semana a ministra da Justiça suíça, Eveline Widmer-Schlumpf, causou polêmica ao insinuar num programa de TV que evasões em grande escala depositadas no país poderiam ser tratadas como fraude fiscal. Mas negou que isso significa que defende um relaxamento do sigilo bancário.

Merz admitiu que já espera mais pressão na próxima reunião do G20, em Londres, onde as maiores economias do mundo voltarão a discutir a crise mundial no começo de abril.

Em época de fuga de capitais, buracos negros como os fornecidos pelo sistema bancário suíço se tornaram um dos principais alvos de ataques.

Fonte: Folha de São Paulo / Marcelo Ninio, de Genebra