Em entrevista ao portal da CUT, presidente da Contraf aponta que aproximação com a base é único caminho para manter condições dignas de trabalho – Após 31 dias de paralisação, a maioria dos bancários aprovou nessa quinta-feira (6) em assembleias por todo o país a proposta da Fenaban (Federação Nacional dos Bancos) e encerrou a greve.
O acordo que prevê 8% de reajuste, abono de R$ 3,5 mil, elevação em 15% no vale alimentação, de 10% no auxílio creche/babá, entre outros itens.
Além dos índices, o presidente da Contraf (Confederação dos Trabalhadores do Ramo Financeiro), Roberto Von der Osten, o Betão, aponta que a negociação traz sinais importantes para as categorias que negociam neste segundo semestre.
Demonstra que será necessária criatividade para driblar os patrões. Se não conseguiram repor integralmente a inflação, os bancários tiraram um acordo de dois anos que garante aumento real para 2017, independente de turbulências da economia. E que, mais do que nunca, o sindicato terá de conscientizar as bases de que só a luta garante condições dignas de trabalho, conforme pregou o lema da campanha salarial bancária neste ano.
Confira abaixo a entrevista.
Como foi a negociação com banqueiros em ano de crise e com empresariado financiando o golpe que mira os direitos trabalhistas?
Betão – Se tem um setor que não poderia se apresentar na mesa de negociação e dizer que teve prejuízo, perdeu venda e produção, esse é o setor financeiro. Então, os banqueiros resolveram vincular o discurso à macroeconomia e mudaram a lógica da inflação passada para a inflação futura.
Para alertar nosso povo, distribuímos uma tabela com todas as negociações que fizemos de 1995 até hoje nos governos FHC (Fernando Henrique Cardoso), Lula e Dilma. Mostrava como foi o INPC (índice que mede a inflação) em cada ano e o reajuste. Ficou claro que Banco do Brasil e Caixa deram reajuste zero durante os anos de Fernando Henrique na presidência, mas, mesmo no ano passado, quando houve declínio do governo Dilma, conseguimos a inflação e aumento de 0,11%. Isso deixou claro que os bancos queriam negociar em patamar FHC para reduzir custos e ampliar lucros.
Essa estratégia é parte de uma visão global do mercado financeiro, no último dia 28 o FMI (Fundo Monetário Internacional), que não dava palpite aqui desde 2003, reapareceu e sugeriu ao governo de Michel Temer aumentar a resiliência e a eficiência no setor financeiro. Na linguagem bancária, ampliar a rentabilidade sobre o patrimônio líquido, que se faz reduzindo despesas.
O problema é que o banco, ao contrário da indústria, não compra insumos materiais, compra mão de obra para prestar serviço. Mais de 70% das despesas operacionais são com salário e para banco ter lucro e melhorar ainda mais a rentabilidade sobre o patrimônio líquido, ele precisa reduzir salário. Por isso, demite e contrata muita gente todo ano, num processo de rotatividade que atinge quase 10% da categoria. Demite quem ganha R$ 6 mil e contrata quem ganha R$ 3 mil.
Nossa resposta foi fazer um acordo de dois anos, blindamos ano que vem e já está definido que iremos repor a inflação com aumento real de 1%. Assim aniquilamos o discurso deles. Se neste ano, só recuperamos 8% de uma inflação de 9,62%, ano que vem já teremos aumento real para descontar da perda deste ano.
Também tiramos da frente o desconto dos dias parados, porque se aceitássemos isso, iríamos ganhar com uma mão e tirar com a outra.
Como você avalia a participação dos bancários nesta campanha salarial, diminuiu ou aumentou?
Betão – Foi fantástica, mais uma vez batemos recorde de paralisação. Desta vez, no 14º dia de greve conseguimos uma quantidade de bancos parados que atingimos somente no 21º dia no ano passado.
Tivemos uma participação muito grande de bancários jovens, que estão chegando agora com muito gás, que acreditam na luta. Nosso lema também ajudava muito, ‘só a luta te garante’. As pessoas perceberam que ficar na agência não garantia sequer emprego e a participação dos trabalhadores foi de coragem, de dar orgulho. Especialmente numa conjuntura de golpe, completamente adversa.
Temos 504 mil trabalhadores hoje no setor e acreditamos que ao menos 350 mil cruzaram os braços.
Uma campanha desse tamanho, com 31 dias de paralisação, é capaz de impactar a negociação de outras categorias com data-base no segundo semestre?
Betão – Primeiro, acredito que conseguimos mostrar para as pessoas que os que não lutarem, não prepararem sua base, vão sofrer. Não tem greve terceirizada, greve sem participação de trabalhador e sem mostrar que é possível e preciso resistir.
Nossa greve foi um alento diante desse cenário de retirada de direitos e de um Congresso Nacional inimigo da classe trabalhadora.
Segundo, mostrarmos que é possível com criatividade fazer muita coisa. Criamos um acordo de dois anos que ainda não havíamos implementado, blindamos o próximo ano, garantimos mesa única de negociação com bancos públicos e acredito que as categorias com dificuldade em repor a inflação podem transformar isso numa vitória.
A CUT e as demais centrais promoverão nas próximas semanas uma greve geral. Como os bancários irão se inserir nessa mobilização?
Betão – Nós tivemos uma grande participação no esquenta para a greve geral (um dia de paralisação em 22 de setembro) e agora vamos fazer essa discussão com nossa base.
O debate que começamos a partir da próxima semana é da defesa dos direitos gerais da classe trabalhadora, estávamos defendendo as questões de bancário, voltadas à nossa categoria. Agora saímos da batalha corporativista para a ampla luta que precisa ser travada por cada cidadão e cada cidadã neste país.
Fonte: CUT