Reportagem chama de “déficit” investimentos em tecnologia e segurança nacional e, ainda, deixa de fora de levantamento as maiores empresas públicas do país
Matéria veiculada pela rede Globo, na edição do Jornal Nacional de 22 de outubro, indicou que as estatais federais devem fechar o ano com déficit de R$ 3,7 bilhões. A reportagem, entretanto, deixou de fora do grupo de cerca de 100 entidades analisadas a Petrobras, Eletrobrás e os bancos públicos. Em 2023, as estatais, incluindo essas empresas, tiveram resultado líquido positivo de R$ 197,9 bilhões. Os bancos públicos federais, sozinhos, contribuíram com R$ 71 bilhões desse montante.
“É preocupante a divulgação desse tipo de matéria, que deixa de considerar fatores muito importantes, como as principais empresas públicas do país. Com isso, gera insegurança na população e no mercado, tanto em relação ao papel e importância das estatais para a economia, concorrência e desenvolvimento do país, quanto em relação à gestão de despesas do governo”, observa a presidenta da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT) e vice-presidenta da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Juvandia Moreira.
Outro ponto da reportagem que chamou atenção é que o “déficit” está concentrado em poucas empresas: Emgepron (Empresa Gerencial de Projetos Navais), Correios, EMGEA, Infraero e Dataprev. Sobre essas estatais, o Ministério de Gestão e Inovação respondeu ao Jornal Nacional que o balanço está relacionado ao aumento de investimentos, como em máquinas e tecnologias, e que não impactam nas despesas públicas, porque estão sendo arcadas com recursos das próprias empresas, não do Tesouro.
No caso Emgepron, por exemplo, que registrou o maior déficit do grupo de estatais (de R$ 2,5 bilhões), a explicação está na política de defesa nacional, com os investimentos na construção de navios para a Marinha.
Impacto das estatais para economia
Além do resultado líquido positivo de quase R$ 200 bilhões, em 2023, as estatais federais pagaram R$ 128,1 bilhões aos acionistas, na forma de dividendos e juros sobre o capital próprio, sendo R$ 49,4 bilhões para a União.
“Esses dados mostram a importância das estatais para o desempenho econômico do país, além do fato de muitas estarem em setores estratégicos, em que é importante atuarem para direcionar o desenvolvimento e garantir que haja o melhor ganho social possível”, explica Juvandia Moreira. “A manutenção e reestatização de empresas públicas é uma realidade em todo o mundo, inclusive nos países desenvolvidos”, completou, lembrando que o movimento de privatização que está ocorrendo em alguns estados brasileiros, como no caso da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), está na contramão da tendência global.
Em 2023, a França, por exemplo, concluiu a reestatização da maior empresa de energia daquele país, voltando a ter 99,9% da propriedade da Électricité de France (EDF). Já, segundo o Public Future, banco de dados coordenado pelo Instituto Transnacional (TNI), da Universidade de Glasgow, na Holanda, cerca de 90% dos sistemas de água do mundo são de gestão pública, atualmente. O trabalho revela ainda que, entre 2000 e 2019, ocorreram mais de 1.400 casos de reestatização no mundo, a maioria concentrados na Europa.
Jogo de informações
“Como sociedade civil, eleitores e consumidores de notícias, precisamos estar atentos ao jogo de informações nas mídias”, ressalta o secretário de Comunicação da Contraf-CUT, Elias Jordão, pontuando que, ao omitir o papel das estatais na realização de investimentos importantes para a economia e para a população brasileira, a reportagem do Jornal Nacional acaba servindo ao ponto de vista do mercado, onde se concentram os maiores interessados pela privatização de companhias públicas.
“Quando narrativas sobre piora do cenário fiscal como essas são sustentadas, você ajuda a justificar, inclusive, os interesses do mercado para a elevação da taxa básica de juros no país, além, é claro, de enfraquecer a imagem das empresas públicas, para preparar a população para que sejam privatizadas, ou seja, deixem de ser geridas pelo Estado e passem a ser controladas pela iniciativa privada, que não garante boa gestão e atendimento de qualidade, como estamos vendo hoje, em São Paulo, onde grande parte da população ficou por dias sem energia após tempestade, porque a companhia que comprou a Eletropaulo não teve capacidade de reestabelecer de maneira célere os atendimentos”, concluiu.
Fonte: Contraf-CUT