A privatização do Banespa, em 20 de novembro de 2000, no governo FHC, foi lembrada na segunda-feira, dia 20, pelo presidente Lula, ao discursar em encontro do Conselho Diretor do Banco do Brasil, em Brasília. Lula culpou a irresponsabilidade gerencial pela venda de bancos públicos. Sem citar nomes, afirmou que alguns políticos usaram essas instituições para fazer caixa dois em campanhas e deu o exemplo do Banespa.
"Talvez [se sinta] arrependimento no Brasil porque bancos importantes como o Banespa foram praticamente doados, vendidos a troco de nada. Jogou-se em cima dos bancos a irresponsabilidade dos governantes que gerenciavam esses bancos ou que muitas vezes usavam esses bancos para fazer os caixas dois da vida em época de campanha eleitoral. Por isso que todos os bancos públicos estavam quebrados", disse Lula.
Um dos responsáveis pelo uso político do Banespa, o ex-governador de São Paulo Orestes Quércia é hoje um dos maiores aliados dentro do PMDB do governador José Serra (PSDB), pré-candidato a presidente em 2010. Quércia sempre negou responsabilidade pela crise do banco.
Preço subavaliado
"O presidente Lula está coberto de razão em dizer que o Banespa foi praticamente doado ao Santander", comentou o secretário de imprensa da Contraf-CUT e diretor da Afubesp, Ademir Wiederkehr. "As entidades sindicais e de representação, que lideraram a defesa do Banespa como banco público, consideravam na época o preço mínimo de venda subavaliado. O valor havia sido fixado em apenas R$ 1,850 bilhão", recordou.
O Banespa foi entregue ao Santander por R$ 7,050 bilhões, quase seis anos depois de sofrer intervenção do Banco Central, em dezembro de 1994, no final do governo Fleury e às vésperas da posse do governo Covas. A venda representou um ágio de 281% sobre o preço mínimo. O lance do Unibanco foi de R$ 2,1 bilhões e o do Bradesco, de R$ 1,86 bilhão. O Itaú não apareceu.
O então procurador da República no Distrito Federal, Luiz Francisco de Souza, disse que o valor oferecido pelo Santander reforçava a tese de que o preço mínimo do banco foi subavaliado pelo governo. Segundo o procurador, com o ágio o Santander seria beneficiado com créditos tributários, garantindo o abatimento de R$ 1,7 bilhão no imposto de renda.
Um estudo feito na época por economistas do Dieese e da Unicamp apurou falhas na avaliação do banco e estimou que o preço mínimo devia ter sido o dobro do valor oficial, que não considerou, entre outros fatores, a marca Banespa e os créditos fiscais.
Após o leilão, o então presidente do Sindicato, João Vaccari Neto, declarou que a venda do banco foi realizada depois de um acerto entre os compradores. "Por que o Itaú não concorreu? Por que o Bradesco apresentou preço mínimo? Por que o Unibanco apresentou proposta baixa? Isso foi um acerto para o Banespa ser vendido para um banco internacional".
"Uma comparação pode ser feita com a venda de 42% das ações do Banrisul, feita pela governadora tucana do Rio Grande do Sul, Yeda Crusius, em 2007. Ele entregou parte do controle do banco gaúcho para investidores estrangeiros por R$ 2 bilhões, valor acima do preço mínimo estabelecido para todo o Banespa, o que comprova a subavaliação do maior banco estadual do país", ressaltou Ademir.
Resistência dos bancários
A exemplo de outras privatizações no governo tucano, os bancários fizeram um movimento de resistência que entrou para a história de lutas dos trabalhadores. Os sindicatos e a Afubesp conquistaram várias liminares e decisões judiciais, ganhando apoio na sociedade e forçando sucessivos adiamentos do leilão.
A venda só ocorreu após o governo FHC ter baixado a Medida Provisória, conhecida como MP do Banespa, que remetia qualquer recurso para a apreciação direta do presidente do STF, ministro Carlos Veloso.
"Ainda me lembro de que, na véspera da privatização, havia uma liminar que impedia a realização do leilão, marcado para as 10h de uma segunda-feira. Velloso fez plantão no fim de semana, recebendo no sábado à tarde o recurso da advocacia-geral da União, então sob o comando de Gilmar Mendes, e cassando na noite de domingo a medida judicial, o que possibilitou a venda do banco para o Santander", destacou Ademir.
BB e Caixa
Lula também criticou as tentativas de privatização do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal e disse que só agora o país tem a dimensão da importância da manutenção de bancos estatais fortes. Ele comparou que parte dos problemas enfrentados pelo presidente norte-americano, Barack Obama, se dá pelo fato de não ter um banco público.
"Tenho participado de G14, G20 e sei a diferença de presidentes que têm bancos públicos e os que não têm e que se deixaram levar pelas teorias da década de 90 de que o mercado resolveria os problemas", completou o presidente.
Fonte: Contraf-CUT com Valor Econômico e Estadão