Acompanhe abaixo a entrevista de Miguel Pereira, Secretário de Organização da Contraf/CUT. Ele fala sobre a regulamentação do Sistema Financeiro Nacional após apresentação da palestra no XI Congresso Interestadual Ordinário do Rio de Janeiro e Espírito Santo.

Como foi a transformação dos bancos em holdings financeiras?

A função precípua dos bancos é a intermediação financeira, ou seja, captar recursos disponíveis para emprestar numa outra ponta. O seu ganho deve ser a variação entre os custos dessa captação e a taxa de juros emprestados. Esta é a configuração de atuação de um banco comercial.

Aos poucos, com a diversificação da oferta de outros produtos e serviços financeiros, os bancos assumiram a configuração de atuação de bancos múltiplos, ou seja, desenvolveram outras carteiras, como administração de fundos, crédito imobiliário, etc., e estabeleceram parcerias ou participações em outras empresas do setor financeiro. Constituíram-se, então, como conglomerados financeiros.

Este tipo de parceria se mostrou muito rentável, por questões diversas, inclusive a queda drástica da inflação nos anos 90, que provocou uma revisão, por parte dos bancos, de sua forma de atuação.

Para ter controle total de todas as operações do setor, os bancos que já tinham o perfil de múltiplos e atuavam enquanto conglomerados passaram, então, a atuar na forma de holdings, ou seja, grandes Sociedades Anônimas que detém o controle de todas as demais empresas, e não mais apenas participações e sociedades em seguradoras, empresas de títulos de capitalização, operações de Finame, fundos lastreados em ações, previdência complementar, etc.

Transformaram-se em verdadeiros supermercados e passaram a ganhar com a venda desses produtos e serviços, com a cobrança de tarifas, com os juros altos, spreads maiores ainda, com operações de tesouraria, ou seja, passaram ganhar em todas as frentes.

Como se organizam juridicamente as holdings financeiras?

A lei que regula o funcionamento dos bancos é a 4.595 de 1964, ou seja, bastante antiga. O fato relevante é que ela institui os órgãos de fiscalização e controle de todo Sistema Financeiro Nacional, e atribui ao Banco Central do Brasil, no caso dos bancos, a função de organização, funcionamento, controle e fiscalização. Diante disso, o BC usa e abusa dessa prerrogativa, através da edição de seus normativos, portarias e resoluções, chegando a legislar sobre o assunto.

É evidente que o BC não tem essa competência, mas é a partir daí que os bancos alteraram suas estruturas. Competência legislativa é do Congresso Nacional, que já deveria ter regulamentado o Artigo 192 da Constituição Federal de 1988 e atualizado toda a legislação do SFN de acordo com os interesses da sociedade. Como exemplo, podemos citar as Resoluções 3110 e 3156 que regulamentam a figura dos correspondentes bancários, que na nossa avaliação são flagrantemente ilegais, porque inclusive autorizam a terceirização dos serviços bancários.

Enquanto grandes empresas de sociedade anônima – S.A., as holdings têm que observar essa legislação específica.

Os bancários têm alguma vantagem nesta transformação? E os prejuízos, quais são?

Na verdade houve um conjunto de mudanças em todo o mundo que impactaram sobremaneira as relações de emprego. Concomitante a essa mudança de perfil de atuação, outras questões políticas conformaram uma outra sociedade.

A redefinição do papel do Estado, com o neoliberalismo e a discussão do Estado mínimo, globalização das economias, reestruturação produtiva, processos de qualidade total, taylorismo, terceirização de serviços e mão de obra, trabalho imaterial e produção por metas, nova divisão do trabalho, tudo contribuiu para o cenário atual.

Isso provocou impactos no nível de emprego da categoria bancária, que diminuiu; na renda desses trabalhadores, que se alterou de fixa para variável, quebrando a lógica dos planos de cargos e salários até então praticados; no perfil dos clientes atendidos nas agências e dos trabalhadores, havendo uma baita discriminação no atendimento, um aumento brutal na produtividade média de cada trabalhador, uma pressão gigantesca para o atingimento das metas e o aparecimento do assédio moral e o aumento das doenças relacionadas ao trabalho. Ou seja, a qualidade de vida dos trabalhadores foi muito prejudicada. E apesar do aumento da renda de alguns segmentos da categoria, podemos afirmar que todas essas medidas foram prejudiciais ao trabalhador bancário.

Uma questão, que poderíamos avaliar como positiva, o aumento da qualificação e especialização da categoria, ainda assim foi utilizada como argumento para manutenção da empregabilidade e a disputa entre os trabalhadores nos locais de trabalho. Ou seja, tem sido utilizada apenas como um diferencial de mercado para a maximização dos lucros dos bancos.

Importante ressaltar que os prejuízos dessa forma de atuação não são apenas para os bancários, mas também para toda a sociedade que não veem nos bancos parceiros para um desenvolvimento saudável, inclusivo e permanente.

Fonte: Feeb RJ/ES

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