O papa Francisco fez ontem (25) um forte discurso pela defesa de um mundo menos desigual justamente em um dos locais onde a desigualdade social é mais visível no Rio de Janeiro. Durante visita à favela Varginha, no Complexo de Manguinhos, na zona norte do Rio de Janeiro, o pontífice apelou aos que têm mais recursos e autoridades para que “não se cansem de trabalhar por um mundo mais justo”.

Varginha fica no complexo onde havia uma das maiores cracolândias da cidade, sendo que uma das áreas de Manguinhos ficou conhecida como Faixa de Gaza por conta dos constantes tiroteios entre policiais e traficantes antes da instalação de uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), no ano passado.

“Ninguém pode permanecer insensível às desigualdades que existem no mundo. Saibam dar sua contribuição para acabar com tantas injustiças sociais”, afirmou. “Nenhum esforço de ‘pacificação’ será duradouro, não haverá harmonia e felicidade para uma sociedade que ignora, que deixa à margem, que abandona na periferia parte de si mesma”, acrescentou. Antes do discurso do papa, um jovem da comunidade disse que pequenas melhorias na comunidade foram feitas depois do anúncio da visita do religioso.

O papa citou, pela primeira vez desde sua chegada ao país, a corrupção. E deu um recado aos jovens, principal foco da Jornada Mundial da Juventude (JMJ).

“Vocês, queridos jovens, possuem uma sensibilidade especial frente às injustiças, mas muitas vezes se desiludem com notícias que falam de corrupção, com pessoas que, em vez de buscar o bem comum, procuram o seu próprio benefício. Também para vocês e para todas as pessoas repito: nunca desanimem, não percam a confiança, não deixem que se apague a esperança. A realidade pode mudar, o homem pode mudar”, ressaltou.

Mais uma vez, o papa arrancou aplausos e risos da plateia ao afirmar que seu desejo era “visitar todos os bairros do país, pedir água fresca e beber um cafezinho e não um copo de cachaça”, o que não foi possível devido à grande extensão territorial do país.

Varginha foi o segundo compromisso de uma extensa agenda cumprida pelo pontífice ontem. Mais cedo, Francisco foi recebido pelo prefeito Eduardo Paes e pelo governador Sergio Cabral no Palácio da Cidade, sede da prefeitura.

O evento durou cerca de 20 minutos e o religioso recebeu as chaves da cidade e cumprimentou esportistas como ex-jogador de futebol do Flamengo Zico, o técnico de futebol Carlos Alberto Parreira e o ex-jogador de basquete Oscar Schmidt, que trata de um câncer no cérebro. Francisco abençoou as bandeiras oficiais dos Jogos Olímpicos e paraolímpicos de 2016 e cumprimentou as pessoas que o aguardavam no jardim na frente do palácio, sob chuva.

No começo da tarde, depois de deixar Manguinhos, o pontífice foi até a catedral metropolitana, no centro, onde encontrou peregrinos da Argentina, país natal do papa. O trajeto, mais uma vez, foi feito a bordo de um Fiat Idea prata, com a janela aberta.

A catedral estava cheia e milhares de pessoas aguardavam do lado de fora. Em discurso de dez minutos no interior do templo, o religioso ressaltou a importância dos idosos e dos jovens e frisou que a sociedade excluiu essas “duas pontas” das decisões.

“Cuidem dos extremos, os idosos e jovens. Que não excluam os mais velhos e mantenham a fé em Jesus”, disse o papa. “Os jovens devem lutar pelos valores. Os idosos têm que falar e transmitir a sabedoria. Não deixem de ser a reserva cultural do nosso povo”, acrescentou.

Após os cumprimentos, o papa Francisco foi para o lado de fora da catedral agradecer aos milhares de fiéis que o aguardavam. Também tirou fotos com os policiais que o acompanhavam.

No fim do dia, o pontífice foi até a Praia de Copacabana, na zona sul do Rio, para a Festa da Acolhida, onde abençoou os milhares de jovens que lotavam a praia apesar da chuva e do frio atípico na cidade mesmo para o inverno. Ele fez um trajeto de cerca de 30 minutos a bordo do papamóvel pela Avenida Atlântica, onde parou algumas vezes para abençoar crianças levadas até ele.

Ao chegar ao palco em Copacabana, Francisco brincou com a fama da cidade e disse que sempre ouviu que os cariocas não gostam de frio: “Vocês estão mostrando que a fé de vocês é maior que o frio e a chuva”.

Após um discurso de 14 minutos, Francisco participou de cerimônia e fez uma homilia e deixou a praia pouco antes das 20h.

A chuva transformou num lamaçal a área em Guaratiba, na zona oeste, onde ocorreriam os eventos de sábado e domingo com a participação do papa. Agora, a vigília e a missa que encerrarão a jornada acontecerão na Praia de Copacabana.

Fonte: Valor Econômico