Alguns bancos de pequeno porte estão em compasso de espera para voltar a operar a plena capacidade. Enquanto a Central de Cessão de Crédito (C3), sistema que tornará transparente a compra e venda de carteiras pelas instituições financeiras, não sair do papel e a oferta de Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs) não ganhar ritmo, o espaço de alavancagem dos bancos menores para conceder empréstimos permanecerá reduzido. Exceções feitas aos eventuais casos em que o controlador opte por um aumento de capital.

As instituições vinham em ritmo acelerado de atividade e algumas delas foram pegas pelo episódio PanAmericano já no limite de alavancagem permitido.

Depois do rombo bilionário encontrado no banco que pertencia a Silvio Santos, a venda de carteiras de crédito para grandes bancos praticamente secou. A oferta de FIDCs também tornou-se mais seletiva desde o fim do ano passado para cá, contribuindo para reduzir de forma significativa a folga de capital dessas instituições financeiras.

É praxe entre os bancos colocar parte de suas carteiras de crédito dentro de fundos de recebíveis. A venda de créditos para bancos maiores e a cessão para fundos liberam espaço no balanço para novos empréstimos, além de funcionar como fundamental fonte de captação e de receita.

O Schahin, por exemplo, especializado no crédito consignado em folha de pagamento e no financiamentos de veículos usados, está operando no limite. Em setembro o banco chegou a ficar desenquadrado do índice mínimo de Basileia, que é de 11% no país. E encerrou dezembro com 11% cravados, de acordo com balanço ainda não auditado.

Embora conte com um caixa de aproximadamente R$ 500 milhões, sua produção de empréstimos esbarra na capacidade de retenção dos ativos de crédito em balanço, uma vez que o patrimônio para a cobertura de eventuais perdas está no menor nível permitido. O patrimônio líquido do Schahin no fim de 2010 era de R$ 229,5 milhões.

O banco até poderia contar com aportes do grupo Schahin, mas a percepção do mercado é que as demais empresas do conglomerado, especialmente a do setor de petróleo, além de demandarem capital intensivo, têm também a preferência da família de acionistas.

O gaúcho Matone, focado na concessão de crédito consignado, estava em setembro desenquadrado, com Basileia de 9,13%. Nesta semana, o banco anunciou a solução para reforçar seu patrimônio (de R$ 247,9 milhões, em dezembro): vendeu 60% das ações para o Banco JBS. Após efetivado um aporte de R$ 300 milhões, o balanço consolidado das duas instituições vai apresentar um patrimônio líquido de R$ 550 milhões.

O Banco Paulista, apesar de ter vendido sua financeira Paulicred para o Fibra em setembro de 2009, ainda conta com uma carteira relevante de financiamentos de veículos – as operações de crédito nessa modalidade somavam R$ 80,9 milhões em junho. As operações de varejo foram cedidas com coobrigação (ou seja, o risco de inadimplência continuou com o banco que cedeu o crédito), por isso os ativos também continuaram no balanço do Paulista, pressionando seu índice de Basileia, que era de 11,65%, em setembro.

Outro que está no limite do índice de Basileia é o banco Morada, do Rio de Janeiro, que tem boa parte de sua produção voltada para o empréstimo consignado. O índice que mede a relação entre o patrimônio de referência e a carteira de crédito da instituição estava em 11,5%, em setembro.

Para Renato Oliva, presidente da ABBC, associação que reúne os bancos de pequeno e médio portes, houve um enxugamento importante de liquidez desde o fim do ano passado para cá, que implicou em uma mudança de paradigma para o setor.

"Os bancos vão precisar centrar-se naquilo que podem carregar [em balanço], e não necessariamente no que vão produzir e vender", diz ele, referindo-se à capacidade das instituições de reter os ativos em balanço, sem poder contar antecipadamente com a cessão desses créditos.

Como na primeira metade de 2010 a cessão de carteiras havia retomado o ritmo anterior à crise financeira, alguns bancos vinham também imprimindo uma velocidade altíssima de produção de financiamentos, já que podiam contar com a "vazão" dessas operações de venda de carteiras. As novas regras do Banco Central (BC), que dobrou a exigência de capital para os financiamentos longos, aumentou ainda mais a pressão.

Segundo fontes de mercado, o Matone chegava a produzir, por mês, R$ 170 milhões em crédito consignado. O Schahin era menos agressivo, produzia cerca de R$ 50 milhões por mês, mas acelerou o ritmo no segundo semestre com a perspectiva de lançamento de um fundo de recebíveis para o qual cederia boa parte dos créditos.

O Fundo de Investimentos em Direitos Creditórios Schahin – Crédito Consignado foi registrado na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em 25 de outubro do ano passado, mas a oferta foi atropelada pelo estouro do escândalo do PanAmericano.

O Matone, da mesmo forma, registrou seu FIDC Matone VI em 22 de outubro e, até o momento, a oferta liderada pelo BTG Pactual não captou recursos.

Assim como ocorreu com o mercado de cessão de carteiras, o de FIDCs também apresentou retração. Do início do ano até ontem, havia na CVM três ofertas de FIDCs registradas, com volume total de R$ 744 milhões. No mesmo período do ano passado, eram oito ofertas no valor de R$ 1,257 bilhão.

"A colocação de FIDCs ainda está complicada", ressalta Fernando Meibak, sócio da Sunrise Investments. Ele menciona o PanAmericano, cujos fundos de recebíveis só se mantinham de pé por causa das sucessivas recompras que o banco fazia dos créditos que ele mesmo tinha vendido para os fundos.

Já é possível perceber, no entanto, esforços para a retomada das ofertas de FIDCs. O Schahin publicou nesta semana aviso aos investidores para a colocação de seu fundo, cuja oferta tem como coordenador líder o Santander. Se a distribuição atingir os R$ 300 milhões previstos, o banco poderá conseguir liberar algo entre três e quatro pontos percentuais de índice de Basileia.

O Cruzeiro do Sul registrou, na quarta-feira, um fundo com volume de R$ 300 milhões. O Pine puxou a fila, ao registrar no dia 3 de fevereiro o seu. A BV Financeira prepara a oferta de seu Fundo de Investimento em Direitos Creditórios V Não-Padronizados. Outras duas instituições estão com operações no forno que devem variar de R$ 150 milhões a R$ 200 milhões.

O Banco Daycoval prepara uma nova tranche de seu fundo de recebíveis Daycoval Veículos, que reúne patrimônio líquido de R$ 174,5 milhões. O Bonsucesso é outro que deve aproveitar a carteira, com lastro em crédito consignado, em operação para nova captação.

Para aliviar a pressão sobre seu índice de Basileia, o Paulista vai tentar pela primeira vez fazer uma emissão externa de dívida subordinada, segundo o diretor Marcelo Adilson Tavarone Torresi.

A ideia é captar R$ 30 milhões, recurso que entra para o patrimônio do banco como capital de nível 2. Além disso, o Paulista apresentou ao BC uma proposta para minimizar o efeito da coobrigação dos ativos cedidos sobre sua Basileia, mas que ainda aguarda aprovação da autoridade monetária.

Procurados, os bancos Morada e Matone não atenderam à reportagem. Os executivos do Schahin informaram que estão em período de silêncio por conta da oferta de seu fundo de recebíveis.

Fonte: Valor Econômico / Aline Lima com colaboração de Alessandra Bellotto