Num recente telefonema com um alto funcionário do Federal Reserve, o diretor-presidente do Citigroup Inc., Vikram Pandit, revelou quem está no topo do novo mundo das finanças americanas.

"Dê uma chance para executarmos", disse Pandit, implorando ao funcionário que não forçasse a diretoria a sair.

Pandit está à beira de perder ainda mais liberdade de manobra. O Citigroup está pedindo ao governo americano que assuma uma participação maior no banco ao converter sua participação de 7,8% em ações preferenciais em até 40% do capital votante. Isso daria ao cambaleante banco um empurrão muito necessário a seu capital, mas menos controle de seu destino.

O pedido do Citigroup pode acabar custando a Pandit seu emprego. Pode também aumentar a pressão política para desmontar o grupo, cuja criação em 1998 ajudou a desmantelar a lei americana da era da Grande Depressão que separava bancos e corretoras nos Estados Unidos. Para os contribuintes, a busca do Citi por uma maior participação estatal envolve riscos, porque os portadores de ações ordinárias são os últimos a receber no caso de uma liquidação.

Entrevistas com mais de 30 executivos, autoridades do mercado, membros do governo e outros mostram que o relacionamento Citigroup-EUA, um dos mais importantes produtos do socorro americano ao sistema financeiro, está tendo um começo tumultuado.

Executivos do Citigroup estão tentando conseguir um equilíbrio quase impossível: tocar os negócios de uma maneira que agrade seus novos mestres estatais, mas que também ajude o banco a recuperar-se de US$ 28 bilhões em prejuízos nos últimos cinco trimestres.

Funcionários do governo americano apelidaram o Citigroup de "Estrela da Morte" nos últimos meses, comparando a ameaça do banco ao sistema financeiro com a arma de destruição em massa de "Guerra nas Estrelas". A portas fechadas, nas palavras de um membro do governo, eles consideram que o gigante bancário é "inadiministrável".

Para complicar a questão, o governo oscila entre surtos de microgerenciamento do banco e períodos em que o ignora. Na tentativa de ser um investidor nem ativo nem passivo, os EUA estão dirigindo a companhia de maneira fragmentada, sem uma estratégia firme ou uma expertise particular.

No centro da confusão está a ausência de uma pessoa ou entidade encarregada da supervisão federal do Citigroup. Isso porque bancos como ele são regulamentados por uma colcha de agências que inclui o Federal Reserve, o Escritório da Controladoria da Moeda e a Federal Deposit Insurance Corp., a agência de seguro-depósito. O Departamento do Tesouro, que é o ministério da fazenda americano, também tem um papel na supervisão porque é ele que está distribuindo todo o dinheiro para socorrer o banco. E membros do Congresso, que aprovaram essas injeções de capital, têm seus próprios interesses em jogo no desenrolar das coisas. Todas essas partes têm dado ao Citi uma salada de ordens, conselhos e críticas às vezes conflitantes.

Por exemplo, diretores do Fed, que é o banco central dos EUA, informaram recentemente a executivos do Citigroup que têm "direitos de observador" que lhes permite participar de reuniões do conselho do banco. Embora o governo não tenha participado dessas reuniões até agora, o fato de que o pode fazer levou alguns executivos do Citi a reclamar privativamente de que os EUA têm agora "poder ilimitado" sobre o banco. Um executivo comparou o papel do governo à espada de Dâmocles, do mito grego que representa o perigo sempre à espreita.

Ontem, Pandit esteve em Washington para reuniões com autoridades de fiscalização e do Tesouro, em meio a dúvidas quanto a seu futuro e o do conselho da companhia. Diretores do Citigroup tentaram acalmar os clientes esta semana. Alguns temem perder negócios devido às incertezas.

O novo papel do governo nas finanças americanas tem sido impressionante. Nos últimos seis meses, os EUA injetaram um total de quase US$ 200 bilhões em 419 instituições bancárias; garantiu pelo menos US$ 420 bilhões em perdas potenciais de um punhado de bancos; determinou que várias firmas se fundissem; e elaborou planos para comprar centenas de bilhões de dólares em hipotecas vencidas e não pagas e outros créditos de recebimento duvidoso dos bancos. Os EUA também concordaram em sustentar o mercado de notas promissórias, ou commercial papers, comprando mais de US$ 1 trilhão em dívida de curto prazo das empresas.

Além da medida em relação ao Citigroup, a mais recente lista de tarefas do governo inclui uma reforma de seu socorro de US$ 150 bilhões à seguradora American International Group. A partir desta semana, o governo fará "testes de resistência" para medir a saúde dos 20 maiores bancos do país, apenas algumas semanas depois da aprovação do pacote de estímulo econômico de US$ 780 bilhões. Nas próximas semanas, o governo planeja ainda orquestrar uma reestruturação da indústria automobilística americana, depois de emprestar um total de US$ 17,4 bilhões à General Motors Corp. e à Chrysler LLC, duas montadoras que estão querendo bilhões mais.

O pedido pelo Citi de ainda mais ajuda vai certamente complicar uma parceria já estremecida por uma falha na comunicação. Desde que o governo ajudou o banco com capital novo nos últimos meses, já fez algumas determinações gerais: ordenou ao Citigroup que vendesse ativos para levantar dinheiro e podasse investimentos de risco; solicitou um remanejamento de seu conselho de administração; e advertiu que se o banco precisar de mais dinheiro a diretoria pode ser forçada a sair.

Mas ao mesmo tempo em que o governo garantiu a sobrevivência do Citigroup, por ora, executivos do banco dizem que foram levados a adivinhar como adotar as diretivas do governo.

Autoridades do governo dizem que os problemas do Citigroup são vastos, o que apresenta questões para várias agências governamentais – todas as quais também estão envolvidas na solução de problemas de outros bancos e da economia. Algumas autoridades dizem que têm dado aos diretores do Citigroup diretrizes sobre o que gostariam que a companhia fizesse. Elas dizem que, até agora, o governo não tem procurado dar ao Citigroup uma cartilha sobre como executar essas diretrizes. As atuais negociações por ajuda estatal, contudo, poderiam resultar em ordens mais diretas sobre como o Citigroup deveria proceder.

Nas últimas semanas, executivos do Citigroup procuraram várias autoridades do governo para obter orientação – sem sucesso. Pandit se encontrou com Lawrence Summers, o principal assessor econômico da Casa Branca. Summers deixou claro que não iria discutir o Citigroup especificamente, e Pandit saiu sem uma ideia melhor de qual a posição do governo Obama na administração dos laços com o banco.

As comunicações de autoridades do governo, por sua vez, têm sido esporádicas. Na sexta-feira à noite, depois que as ações do Citi caíram a US$ 1,95, o nível mais baixo em 18 anos, altos executivos procuraram a Controladoria da Moeda e o Fed de Nova York. Eles queriam discutir a proposta do Citigroup de aumentar a fatia do governo. As conversas foram construtivas, mas não podiam ir muito adiante antes que o Tesouro se pronunciasse.

Durante o fim de semana, o Tesouro não respondeu. Então, domingo à noite, o celular de Pandit tocou. Era o secretário do Tesouro, Timothy Geithner, ligando com uma mensagem: "Acho que precisamos fazer algo." Geithner não foi muito além em detalhes, mas disse que estava pronto a considerar a ideia do Citigroup de converter uma grande fatia das ações preferenciais do governo em ações com direito a voto.

A pressão do governo para enxugar a companhia forçou executivos do Citigroup a considerar uma série de planos antes inimagináveis. Eles concordaram em janeiro em vender a corretora Smith Barney para o Morgan Stanley depois de insistir por anos que ela não estava à venda. O Citigroup também se dividiu em duas partes, com o objetivo de vender mais ativos e negócios.

Agora, executivos do grupo estão lutando com a possibilidade de se desfazer do Banamex, seu lucrativo banco de varejo no México. Depois de uma reunião com Lawrence Summers, o principal assessor econômico do presidente americano Barack Obama, Pandit voou à Cidade do México, tentando acalmar empregados convencidos de que o Citi será forçado a vender o Banamex.

Fonte: The Wall Street Journal / Monica Langley e David Enrich