Reduzir a idade penal de 18 para 16 anos é o objetivo da Proposta de Emenda Constitucional (PEC 33/2012) do relator Ricardo Ferraço (PSDB-ES) que pode ser votada nesta quarta (20) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. A que tudo indica, se aprovada, segue para o plenário na próxima semana.
Hoje jovens e adolescentes que cometem atos infracionais cumprem medidas socioeducativa. Isso porque o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) já os pune, mas garante estrutura para um possível retorno à sociedade. Se aprovada a PEC, abre a possibilidade de julgamento pelo código penal e o jovem pode ir direto para o sistema penitenciário.
Em nota publicada nesta terça (19), a Pastoral da Juventude, organização da Igreja Católica ligada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), critica a PEC e o sistema carcerário.
“Trancar jovens com 16 anos em um sistema penitenciário falido que não tem cumprido com a sua função social e tem demonstrado ser uma escola do crime, não assegura a reinserção e reeducação dessas pessoas, muito menos a diminuição da violência. A proposta de redução da maioridade penal fortalece a política criminal e afronta a proteção integral do/a adolescente”, diz trecho da nota.
Para a secretária Nacional da Juventude da CUT, Edjane Rodrigues, se o ECA tivesse sido aplicado de fato ao longo dos 25 anos hoje a gente não haveria demandas da extrema direita para discutir a redução da maioridade penal no Brasil.
“Com crianças na escola, com direito à educação e à saúde e com os direitos sendo verdadeiramente implementados teríamos uma criminalidade muito menor”, afirma o Edjane.
Para Edjane, o congresso mais uma vez inverte a pauta.
“O que precisamos é discutir o modelo de segurança pública que temos hoje. Segundo o mapa da violência de 2016, são jovens, homens, pobres e negros os que mais morrem. Essa violência é agravada pela desigualdade social, a falta de emprego, a baixa escolaridade, a urbanização rápida e irregular, drogas ilícitas e armas. Não será a redução da maioridade penal, com o encarceramento em massa, que resolveremos esse problema”, finalizou.
Leonardo Duarte, conselheiro tutelar e coordenador do movimento contra redução, em entrevista para o portal da CUT, afirmou que a Frente Nacional Contra a Redução da Maioridade Penal é contra esta medida por entender que isso só trará aumento nos índices de violência, tendo em vista os grandes números de reincidência do sistema penitenciário.
O Senador Lindbergh Farias, em sua conta no Twitter, publicou um vídeo indignado com a proposta. “Nós estamos agravando a situação”, destacou.
Para Lindbergh, a possibilidade de redução da maioridade penal significa uma estratégica equivocada diante da situação de extermínio dos jovens pobres e negros nas regiões de periferia do Brasil.
“O que nós precisamos, de fato, é garantir um futuro digno para essa juventude. Vamos enfrentar o discurso de ódio e de medo das bancadas conservadoras com muita energia para não prejudicar o futuro dos nossos jovens”, frizou
Abaixo a nota na integra da Pastoral da Juventude
A Pastoral da Juventude (PJ), organização da Igreja Católica ligada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), possui mais de 40 anos de história e tem articulação nos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal, com mais de 10 mil grupos de jovens, coordenações locais, estaduais e nacional. Diante desse acúmulo histórico de inserção, defesa e promoção da vida da juventude, a PJ vem por meio desta nota, manifestar seu REPÚDIO a todas tentativas de redução da maioridade penal.
O Brasil possui a quarta maior população carcerária do mundo, com mais de 563 mil pessoas encarceradas, atrás apenas dos Estados Unidos (2,2 milhões), da China (1,7 milhão) e Rússia (676 mil), conforme dados apresentados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em junho de 2014. Cerca de 80% da população carcerária brasileira está presa por crime contra o patrimônio ou por tráfico de entorpecentes; 55% tem menos de 29 anos; mais de 60% é negra; aproximadamente 90% sequer concluiu o ensino médio.
A população de adolescentes (12 a 17 anos) no Brasil é de 20.666.575 (IBGE 2010). Deste total, 22.077 (0,01%) estão em conflito com a Lei, sendo 1.852 fichados por prática de homicídio.
Além da característica massiva do encarceramento no Brasil, soma-se o caráter seletivo do sistema penal: mesmo com a diversidade étnica e social da população brasileira, as pessoas submetidas ao sistema prisional têm quase sempre a mesma cor e provêm da mesma classe social e territórios geográficos historicamente deixados às margens do processo do desenvolvimento brasileiro: são pessoas jovens, pobres, periféricas e negras.
Pela incompetência e omissão do Estado e da sociedade em negar direitos fundamentais básicos constitucionalmente garantidos, prefere-se jogar esses e essas jovens e adolescentes para atrás das grades. O Estado brasileiro não tem efetivado a aplicação mais ajustada das medidas socioeducativas que estão previstas no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), que existe há 25 anos, e poucas são as iniciativas de execução de políticas públicas de juventude eficientes, que são essenciais para uma vida digna e segura.
Trancar jovens com 16 anos em um sistema penitenciário falido que não tem cumprido com a sua função social e tem demonstrado ser uma escola do crime, não assegura a reinserção e reeducação dessas pessoas, muito menos a diminuição da violência. A proposta de redução da maioridade penal fortalece a política criminal e afronta a proteção integral do/a adolescente.
Em nota¹ publicada em maio de 2013, a CNBB afirma que reduzir a maioridade penal é ignorar o contexto da cláusula pétrea constitucional – Constituição Federal, art. 228 –, além de confrontar a Convenção dos Direitos da Criança e do Adolescente, as regras Mínimas de Beijing, as Diretrizes para Prevenção da Delinquência Juvenil, as Regras Mínimas para Proteção dos Menores Privados de Liberdade (Regras de Riad), o Pacto de San José da Costa Rica e o Estatuto da Criança e do Adolescente.
Compreendemos que a criminalidade e a violência na qual estão inseridos/as adolescentes e jovens são frutos de um modelo neoliberal de produção e consumo que opera na manutenção das injustiças socioeconômicas, e devem urgentemente ser transformadas, especialmente a partir da construção de políticas que garantam direitos básicos à juventude e adolescentes, como o direito à educação e saúde de qualidade, moradia digna e trabalho decente.
Ser favorável a esta medida é também ferir o nosso desejo e horizonte de vida em plenitude para toda a juventude. Conclamamos a sociedade a compreender que é tarefa de todos/as trabalharmos pela cultura de paz, priorizando o cuidado, a escuta e o compromisso com a vida da juventude, adolescentes e crianças para um Brasil pleno de paz, justiça e dignidade.
Aline Ogliari
Secretária Nacional da Pastoral da Juventude,
Pela Coordenação Nacional e Comissão Nacional de Assessores/as da PJ