Sob o título "Venceu a gravata vermelha", a publicação avalia que não é apenas uma troca de Fábio Barbosa por Marcial Portela, mas, principalmente, uma mudança de posição do banco: a política de sustentabilidade dá lugar à de resultado.
Venceu a gravata vermelha
A saída de Fabio Barbosa da presidência do Santander sugere que a operação brasileira terá de se alinhar à matriz espanhola e trocar sustentabilidade por resultados como prioridade.
FIM DE ERA
Na mais instigante dança das cadeiras em bancos brasileiros dos últimos anos, Fabio Barbosa anunciou, no dia 22 de dezembro, que está deixando a presidência executiva do Santander para assumir o comando do conselho de administração.
Por sua vez, o espanhol Marcial Portela, atual presidente do conselho, torna-se CEO em 4 de fevereiro e passa a tocar o dia a dia do banco. O reposicionamento de Barbosa havia sido definido, por iniciativa dele, cerca de 15 dias antes do anúncio. E não vazou.
Mesmo amigos bem próximos que com ele estiveram uma semana antes do Dia D foram surpreendidos pela notícia. Atribuem sua "queda para cima" a uma discordância com a matriz sobre os rumos do Santander Brasil, que estariam desalinhados com a estratégia global. Com os países desenvolvidos, em geral, e a Espanha, em particular, em clima de contenção de danos devido à crise financeira mundial, a influente agenda "verde" da subsidiária brasileira (o empenho de Barbosa em relação à sustentabilidade) deixou de ser prioritária.
A mensagem dos espanhóis nos últimos meses: o Brasil não pode ser uma exceção. Sustentabilidade é bom, e eles gostam. Mas não à frente dos resultados. A troca de comando no banco era a chamada "bola cantada", e a era Fabio Barbosa durou mais do que a maioria imaginava.
Havia, desde o anúncio da aquisição do ABN Real pelo Santander, uma expectativa de choque cultural entre espanhóis e brasileiros. Uma leitura que tem sido feita no mercado é que tal choque teria sido amortecido, em grande medida, pela atuação de Barbosa durante esses três anos. Mas uma vez completada a integração dos bancos, sua permanência à frente da organização teria perdido o sentido, por causa das diferenças culturais.
Pelo menos parte dos funcionários aposta que, a partir de agora, deve imperar a verdadeira política do banco espanhol. "Haverá sempre uma espada na cabeça para bater metas", diz um deles. A aura verde do ABN teria sido, enfim, sufocada pela gravata vermelha que é marca registrada dos executivos do Santander.
De outubro de 2009 até dezembro de 2010, ações do Santander subiram só 1,6%, ante 20% do Bradesco.
SEM CHOQUE?
Barbosa não endossa essa tese. Nem poderia, dada a posição de destaque que segue ocupando na corporação. Primeiro, diz ele, não se trata de uma saída, mas de uma mudança de cargo. Desde o início do processo de integração do Real, ele vinha manifestando internamente a intenção de reorganizar sua agenda de modo a poder se dedicar mais à gestão estratégica e menos à operacional.
Com a fusão dos dois bancos basicamente encerrada em novembro, chegou a hora de cumprir o combinado. Barbosa nega que tenha havido choque e diz até que houve uma evolução nas relações entre as duas partes nos últimos anos. "Tivemos uma grande mudança no comportamento interno, com absorção de traços culturais do Real e do Santander naquilo que entendemos ser o melhor dos dois", afirmou a Época NEGÓCIOS.
Segundo Barbosa, a troca de comando não foi feita com a intenção de sinalizar uma mudança de orientação, mas de marcar o término de uma fase. "Até aqui, a ênfase estratégica estava na integração", afirma. "Agora, temos de olhar para outras coisas. Uma delas é a necessidade de o banco se integrar, de forma mais sólida, à organização mundial do Santander."
Para isso, seu sucessor é a pessoa certa. Ex-presidente da área internacional da Telefônica, executivo do Santander desde 1998, Portela foi eleito por Emilio Botin, presidente mundial do conglomerado, para supervisionar a integração do Real logo depois da aquisição do banco, em outubro de 2007.
Desde então, passa metade do tempo em Madri e metade em São Paulo, para onde está se mudando para valer agora, em um momento muito especial. No terceiro trimestre do ano recém-encerrado, a subsidiária brasileira do Santander tornou-se a mais lucrativa do conglomerado multinacional, respondendo por um quarto dos resultados.
Olhando por esse prisma, talvez a mudança tenha vindo na hora certa. "As pessoas têm ciclos nas organizações", afirma Betania Tanure, professora da PUC de Minas Gerais e consultora de empresas. "A sabedoria está em reconhecer o fim do ciclo antes que todo mundo o faça".
A seu ver, o valor de Barbosa não é mais o de um executivo de excepcional desempenho, mas o de um presidente estadista. "A causa dele ficou maior do que a organização, e seu papel, maior que o cargo", diz.
Na análise fria de um profissional do próprio Santander, Barbosa é bem visto pelo mercado e pelo baixo clero do banco, mas não estava entregando os resultados esperados pela matriz – e pelo mercado. Desde que abriu capital, o Santander manteve praticamente estável o valor de suas ações.
Do fechamento da Bovespa em 7 de outubro de 2009 até 22 de dezembro, quando foi anunciada a troca de cadeiras, a ação do banco valorizou apenas 1,6%. No mesmo período, segundo levantamento da empresa de dados financeiros Economática, os papéis do Bradesco subiram 20,2%, os do Itaú Unibanco, 15,4%, e os do Banco do Brasil, 11,1%.
Com a Espanha em crise, a pressão por resultados aqui é ainda maior. Uma vez concluída a integração entre Real e Santander, as prioridades são outras. A maioria delas ligada a metas de crescimento e rentabilidade que foram deixadas em segundo plano.
O IPO injetou R$ 14,1 bilhões no caixa do banco há quase um ano e meio. Esperava-se que todo esse capital extra resultasse em uma expansão fulminante da carteira de crédito, mas isso não aconteceu. Ora, para o bem e para o mal, os espanhóis são muito práticos. O que vale é entregar resultados. Como, discute-se depois.
Fonte: Afubesp com Revista Época Negócios