O presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicadas (Ipea), Marcio Pochmann, aponta os altos índices de rotatividade como indicativo de que a legislação trabalhista é demasiadamente flexível, ao contrário do que defendem os empresários. Segundo levantamento realizado pelo economista a partir de dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), a taxa média mensal de rotatividade nos últimos seis meses aumentou para 3,9%.
De outubro de 2008 a março de 2009, a soma chega a 23,4% de trocas de emprego com carteira assinada. O problema é que, em períodos de ausência de crescimento ou de retração econômica, o trabalhador que perde o emprego é substituído por outro com salário menor.
Em entrevista a Rede Brasil Atual, Pochmann destaca que o cenário significa menor produtividade e uma defasagem em termos de qualificação profissional. "O trabalhador não tem garantia de que vai permanecer na empresa, não sabe que tipo de qualificação deve fazer, por isso não faz. Ao mesmo tempo, a empresa não investe na formação com receio de que essa aplicação se transforme em um custo, na medida em que ela forma alguém que pode ir trabalhar na própria concorrente com um salário um pouco maior."
Um dos problemas diz respeito à elevação de gastos com seguridade social, no caso o seguro desemprego, e menor arrecadação, já que os salários são reduzidos.
Leia os principais trechos:
RBA – Por que a rotatividade se expandiu nos últimos meses no Brasil?
A rotatividade é um fenômeno conhecido dos trabalhadores, não é novidade. Desde a introdução do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço [FGTS], em 1966, as empresas utilizam essa oportunidade de demitir o trabalhador de maior remuneração e contratar outro de remuneração menor como forma de ampliar empregos sem aumentar o custo de contratação.
Em geral nos períodos de expansão econômica, além desse fenômeno ocupacional, há um movimento do trabalhador, a troca de um emprego por outro com salário melhor. Em tempos de crise esse movimento dos empregados desaparece, e a rotatividade restringe-se a um fenômeno fundamentalmente utilizado pelo empregador.
Isso mostra que as empresas vêm usando, de uma forma significativa, o recurso da rotatividade para rebaixar custos de contratação e provocando o achatamento salarial, reduzindo a remuneração a níveis cada vez mais próximos do salário mínimoNeste período [dos últimos seis meses] em que a economia desacelerou, acreditávamos que a rotatividade havia caído, mas constatamos a expansão. Isso mostra que as empresas vêm usando, de uma forma significativa, o recurso da rotatividade para rebaixar custos de contratação e provocando o achatamento salarial, reduzindo a remuneração a níveis cada vez mais próximos do salário mínimo.
RBA – Em 2006, em levantamento similar, se apontava taxas de rotatividade de 30% ao ano, e os dados atuais mostram aumento.
Sim, é uma trajetória de aceleração. Ao contrário do que os empresários afirmam, que o mercado de trabalho seria muito rígido, se percebe pelo fenômeno da rotatividade a enorme possibilidade de flexibilização quantitativa. A possibilidade de contratar e demitir é muito rápida. Isso significa uma restrição para os trabalhadores e não para as empresas.
RBA – Do ponto de vista da produtividade, essa prática favorece também à empresa a longo prazo ou apenas a redução de custos imediata que conta?
Ao contrário do que os empresários afirmam, que o mercado de trabalho seria muito rígido, se percebe pelo fenômeno da rotatividade a enorme possibilidade de flexibilização quantitativa. A possibilidade de contratar e demitir é muito rápida. Isso significa uma restrição para os trabalhadores e não para as empresasTemos, com essa enorme flexibilidade, um impacto negativo na qualificação dos trabalhadores e na própria credibilidade que a relação de trabalho deveria ter.
O trabalhador não tem garantia de que vai permanecer na empresa, não sabe que tipo de qualificação deve fazer, por isso não faz. Ao mesmo tempo, a empresa não investe na formação com receio de que essa aplicação se transforme em um custo, na medida em que ela forma alguém que pode ir trabalhar na própria concorrente com um salário um pouco maior.
RBA – Um debate recorrente no país diz respeito à terceirização. As prestadoras de serviço estão entre as que mais utilizam a rotatividade de mão-de-obra. É possível lidar com as duas questões nesse debate?
Acredito que falta uma regulação no mercado de trabalho, especialmente em relação à terceirização. A ausência desses critérios de regulação permitem o abuso dessa forma de contratação com salários ainda menores. A marca do último ciclo de expansão da economia [no país], acompanhamos uma situação em que, a cada dez vagas, quatro eram geradas pela terceirização.
É uma faixa muito grande na geração de empregos, mas na realidade isso ocorre muitas vezes à margem da legislação, fazendo com que não apenas as condições de trabalho sejam piores como a terceirização seja um instrumento de maior de empregabilidade mas também de maior precatização da mão-de-obra. Há vários projetos em curso, mas não teria condições de analisar cada um.
Fonte: Anselmo Massad – Rede Brasil Atual