São Paulo – Mais um grande banco produz nota tentando convencer funcionários de que reforma trabalhista é boa para o Brasil; argumento usado é falso: países que flexibilizaram direitos, aumentaram o desemprego. Depois do Bradesco e do Itaú, a reforma trabalhista de Temer – que na verdade é um desmonte dos direitos previstos na CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) – foi defendida por mais um grande banco. O Santander produziu nota de 11 páginas tentando convencer seus funcionários de que o projeto de Temer (PLC 38), que tramita em regime de urgência no Senado, é bom para os trabalhadores e para o país.
“Na nota, o banco usa gráficos, números, abusa do economês e cita uma série de estudos supostamente científicos para defender uma tese que já se mostrou falsa no mundo real: a de que flexibilizar direitos dos trabalhadores cria empregos e aumenta o trabalho formal. Na verdade, o que se viu em dezenas de países que apostaram na redução de direitos não foi aumento de postos de trabalho. Pelo contrário, o desemprego é que cresceu nesses países após as reformas”, rebate a diretora do Sindicato e coordenadora da Comissão de Organização dos Empregados do Santander (COE), Maria Rosani.
A dirigente se refere a estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que analisou dados de 111 países que implementaram reformas para flexibilizar as relações de trabalho, no período entre 2008 e 2014. O levantamento mostrou que tanto em países desenvolvidos quanto nos de economia em desenvolvimento, a desregulamentação do trabalho resultou em queda na taxa de emprego no ano seguinte.
“O que gera emprego é o crescimento da economia. Foi justamente quando o PIB do Brasil cresceu que também houve aumento no número de empregos no país e de postos de trabalho formal. Foi o que aconteceu no período entre 2004 e 2014 [veja gráfico abaixo]. E nesse período não houve redução de direitos trabalhistas. Novamente a realidade mostra que a tese do Santander, de que flexibilizar leva a mais investimentos dos empresários e maior formalização do emprego, está errada”, argumenta Maria Rosani.
Extinção de empregos – Maria Rosani lembra que apesar de na nota o Santander se mostrar preocupado com a criação de empregos no país, na realidade contribui para o desemprego. “Foram 3.245 postos de trabalho extintos entre março de 2016 e março de 2017. E isso com o banco tendo lucro recorde [R$ 2,280 bi no primeiro trimestre, crescimento de 37,3% em 12 meses] e respondendo pela maior parcela de lucro do grupo espanhol [26%]. É no mínimo uma hipocrisia soltar nota defendendo geração de emprego no país”.
Jogo de interesses – Ela também chama atenção para o fato de a nota do Santander ter sido divulgada agora, quando o banco acaba de ter perdoada uma dívida de R$ 338 milhões pelo governo, via Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). “O Itaú já havia sido perdoado em uma dívida de R$ 20 bilhões. Fica claro que quem manda nesse governo é o capital. Os banqueiros financiaram o golpe e agora estão sendo beneficiados”, diz Rosani.
Aumento das desigualdades – Outra dirigente e funcionária do Santander, Vera Marchioni, destaca que, na nota, o banco espanhol parece desconhecer que o Brasil ainda está entre os 10 países mais desiguais do mundo. “Como flexibilizar as leis, a jornada, os salários, a proteção para os demitidos se não temos política de acesso a moradia digna, educação e saúde pública? Vamos aumentar ainda mais a miséria no país”, critica, acrescentando que o projeto de Temer vai resultar em salários menores e diminuição da renda das famílias, o que levará à diminuição do consumo, piora da economia, e mais desemprego.
“A regulação do mercado de trabalho é parte do processo civilizatório e foi conquistada depois de muita luta, é necessária para coibir abusos na relação com o empregador, detentor do poder econômico. A CLT criada em 1943, já sofreu inúmeras mudanças, e visa garantir direitos mínimos aos trabalhadores que é a parte mais fraca na relação capital x trabalho”, lembra Vera.
Descompromisso com o Brasil – Vera destaca ainda que o Santander e demais bancos no país nunca passaram por crise, mas seguem demitindo e por isso mesmo reduzindo sua folha de pagamento ano a ano. “As grandes corporações não têm nenhum compromisso social, apenas compromisso com o aumento da remuneração dos seus executivos e acionistas, contribuindo para o aumento da desigualdade e concentração de renda.”
Não é à toa, segundo Vera, que os bancos defendem a reforma trabalhista e inclusive participaram da elaboração do texto, como denunciou a publicação online The Intercept Brasil. “Eles querem gastar menos ainda com suas folhas de pagamento e aumentar mais ainda seus lucros.”