O ex-presidente Lula enviou uma mensagem à XXI Marcha Anual dos Prefeitos, que se encerra nesta quinta-feira (24), em Brasília. Lula reafirmou sua inocência e a manutenção de sua candidatura à Presidência.

“Se alguém quer ser presidente, que me derrote no voto”, afirmou Lula na mensagem que encerrou respondendo a quatro perguntas enviadas pela entidade.

Leia a íntegra da mensagem e das respostas:

“Meus caros amigos prefeitos e prefeitas que vieram até Brasília para mais uma Marcha, uma das datas mais importantes do calendário político nacional, e que quando eu fui presidente da República, sempre fiz questão de prestigiar.

A marcha é importante porque não se pode governar o Brasil sentado em um palácio em Brasília. O Brasil é muito grande, muito diverso. O presidente precisa dialogar com o povo, com as autoridades locais, ver os problemas de perto e não só os problemas, mas também conhecer as soluções de perto.  As vezes quem está no governo federal acha que os prefeitos vêm só trazer problemas, quando na realidade muitas vezes o que eles trazem são soluções.

E a Marcha é, como diz o ditado, se Maomé não vai a montanha, a montanha dos prefeitos vem até Brasília para dialogar e cobrar, porque cobrar é parte da democracia.

Eu gosto sempre de lembrar que antes de mim houve um governo que chegou a jogar cachorros contra a Marcha dos Prefeitos. Uma coisa absurda. Nós fizemos diferente. O nosso governo montou uma sala de atendimento permanente aos prefeitos, para orientá-los e escutá-los. E atendemos a todos, independentemente de partido, independentemente de gostarem do Lula ou não, de gostarem do PT ou não, porque o prefeito não representa um partido ou parte da sua cidade. Ele representa todo o povo e é no município onde as pessoas vivem. Tem uma música de campanha antiga do PT que eu gosto muito que diz que uma cidade pode parecer pequena perto de um país, mas é na cidade que a gente começa a ser feliz.

Se houve um passado triste onde os seus antecessores prefeitos eram recebidos com cachorros pelo governo federal, hoje tenho que lamentar não poder estar com vocês por causa de uma sentença mentirosa, que me condenou por “atos de ofício indeterminados”. Agora, para fins políticos, podem difamar gestores sem provas e condená-los sem dizer porque o estão condenando. Isso não deveria preocupar apenas um partido ou outro, mas a todos que prezam pela democracia e pela justiça.

Eu sou candidato a presidente porque não cometi crime nenhum. Eu sou candidato porque tenho honra e agi com responsabilidade, ética e correção nos meus oito anos de presidente da República. Eu sou candidato porque assumi o Brasil em uma situação difícil e saí do mandato com o melhor momento do país em sua história. Eu sou candidato para melhorar a vida do povo. E o que fiz uma vez como presidente eu sei que posso fazer novamente. Com a experiência que tive falo com tranquilidade que posso fazer um governo ainda melhor do que aqueles que eu já fiz.

Eu sou candidato porque na democracia quem decide os governantes é o povo. Vocês são prefeitos eleitos, e tem que ser respeitados por isso. Então, seria importante meus adversários também assumirem isso, deixem o povo decidir quem será o próximo presidente do Brasil. Se alguém quer ser presidente, que me derrotem no voto. Meus adversários tem 3 anos de Jornal Nacional falando mal de mim de dianteira, não tem porque terem medo das urnas. O PT sabe acatar resultado eleitoral. O Brasil precisa resolver seus rumos de forma democrática.

E eu não preciso dizer como os outros candidatos “eu acho, eu penso”. Eu posso dizer “eu fiz”. Eu posso dizer “vocês viram o que aconteceu”. Meu compromisso com a democracia é real. Eu tinha aprovação alta mas não fiz emenda de reeleição. Enviamos recursos e trabalhamos junto com todas as prefeituras. Criamos projetos em parceria com os prefeitos. O cadastro do Bolsa Família, por exemplo, é feito pelas prefeituras.

As cidades tiveram obras do Minha Casa Minha Vida, obras do PAC. Receberam campus de universidades no interior, antes tinha só nas capitais. Institutos Federais de ensino. Foram abertos editais com recursos para inúmeros projetos das prefeituras nas mais diversas áreas. O Fundo de Participação dos Municípios teve cada vez mais recursos.

Eu fui o presidente de todos os brasileiros. E não quero ser presidente de novo para olhar para trás e dividir o país em paneleiros ou petistas. Eu quero fazer o que eu fiz quando fui presidente: cuidar do Brasil, de todos os brasileiros, com um olhar de mais carinho para os que precisam mais. Porque quando os que precisam mais melhoram de vida toda a sociedade sobe com eles. O comércio vende mais, a indústria produz mais, a prefeitura arrecada mais. E quando o país se perde em conflito, e tem um governo sem legitimidade, como estamos vendo agora, todos perdem.

Quem foi prefeito quando eu fui presidente sabe: no fim do meu governo tinha muito menos gente vindo bater na porta da casa de vocês porque estava com fome, porque não tinha emprego. E tinha muito mais projeto do governo federal com as prefeituras.

Então esse é meu compromisso com vocês: reestabelecer a democracia, o diálogo nesse país. Um governo para todos. Um governo de inclusão, comprometido em cuidar dos mais pobres e retomar o crescimento da economia, das oportunidades. Um governo comprometido com a educação e a construção de um futuro melhor para o Brasil. Um governo com a consciência que um país melhor não se faz com um governo federal isolado em um palácio em Brasília, mas junto com toda a sociedade, empresários e trabalhadores, governadores e prefeitos, que estão ali, na linha de frente, batalhando por um futuro melhor para os habitantes da sua cidade. Um governo que não ouça só o mercado financeiro de São Paulo e a Rede Globo no Rio de Janeiro, mas que ouça toda a sociedade de todo o Brasil.

E vocês sabem que eu posso fazer e que eu sei como fazer. Porque eu já fiz. E vou fazer de novo.

Muito obrigado.

Lula”

Respostas às perguntas dos prefeitos:

  1. O diálogo federativo é extremamente importante para a construção da governança de políticas públicas eficientes, capazes de atender as demandas cada vez maiores da população. Sendo assim, o senhor assume o compromisso de receber pessoalmente a Confederação Nacional de Municípios em reuniões trimestrais para pactuar uma agenda de trabalho entre o Governo Federal e os Municípios?

Eu me comprometo a receber pessoalmente a Confederação Nacional dos Municípios em reuniões trimestrais e mais que isso: reativar uma sala de atendimento permanente de prefeitos no Palácio do Planalto e estabelecer um canal de diálogo permanente entre a Confederação e meu gabinete para discutirmos a evolução de uma pauta de reinvindicações dos municípios. E podem fazer a reivindicação que for, reinvindicação não será entendida como ofensa. Até porque ninguém fez mais reivindicação do que eu na história desse país. Então os prefeitos poderão trazer sua pauta e dialogar no mais alto nível do governo federal. E igualzinho como era quando fui presidente, não será olhado o partido do prefeito. Mas sim que ele representa um município brasileiro e tem que ser ouvido com atenção, respeito e dentro do espírito de trabalharmos juntos pelo país.

  1. Carga Tributária e Transferências a carga tributária brasileira em 2017 fechou em 32,4% do PIB. No entanto, apenas 21% do bolo arrecadado, ou seja, 6,8% do PIB, chegou às cidades, o que é insuficiente para custear as políticas públicas. Quais ações concretas o seu governo pretende tomar para corrigir esta distorção?

No meu governo, aumentou muito o Fundo de Participação dos municípios. Hoje, qualquer candidato que vier aqui, e disser que vai aumentar os repasses sem mudar a PEC do Teto de Gastos aprovada pelo governo Temer vai estar mentindo. E eu entendo a filiação partidária dos prefeitos, que muitos já tem seus candidatos, mas vocês sabem disso tanto quanto eu: sem revisar a PEC do Teto de Gastos o próximo governo só irá fazer cortes e cortes e isso vai afetar cada vez mais os repasses aos municípios. Então essa é uma ação concreta. Outra é discutir a estrutura tributária. Dar assistência aos prefeitos na elaboração de projetos e uso de fundos federais. O meu coordenador de plano de governo, Fernando Haddad, foi prefeito, e ele defendia que parte da CIDE seja usada para financiar o transporte urbano. Então há muito que se pode fazer e vamos discutir com os prefeitos, o congresso e a sociedade, porque para corrigir essas distorções será necessário também fazer mudanças que passem no Congresso Nacional.

  1. Saúde e Assistência Social Saúde e Assistência Social são direitos do cidadão. Como o financiamento dos dois sistemas deve ser tripartite, a atual oferta dos serviços sofre com o congelamento de gastos da União em função da Emenda do Teto do Gasto Público. Em 2017, os Municípios já comprometeram 24% dos seus orçamentos na manutenção das ações e dos serviços públicos em Saúde. O orçamento do governo federal para essas duas áreas vem sendo reduzido ano a ano. No caso da Assistência Social, o orçamento reduziu em quase 20%. Como seu governo pretende atuar nessas áreas de gestão de forma a evitar que todos os problemas recaiam sobre os Municípios e seus gestores?

Precisamos voltar a gerar empregos e recuperar os programas sociais. Assim menos problemas recairão nas costas dos municípios, que estão sofrendo os efeitos da crise atual. Vamos retomar a ação do governo federal, em parceria com os municípios, nessa área. Vamos retomar os investimentos em infraestrutura, para gerar mais empregos, o que reduz a pressão sobre a assistência social.

E vocês citam na pergunta e vale a pena repetir, rever a Emenda do Teto dos Gastos Públicos. Vocês sabem o desastre que será para o mandato dos senhores prefeitos e para o futuro das cidades se ela for mantida. E isso não quer dizer defender irresponsabilidade fiscal. Eu sou o presidente que fiz o mais alto superávit primário da história do Brasil, 4,25% do PIB. Em 2004 eu vim aqui na Marcha dos Prefeitos, e meu saudoso companheiro Marcelo Déda reclamou que eu tinha contingenciado o orçamento federal. Nós fizemos um orçamento realista e os orçamentos tem que ser realistas e responsáveis. O que não é possível é congelar por 20 anos os gastos públicos no Brasil, independente do país ganhar na loteria ou sofrer um terremoto. Isso é loucura e é na prática uma camisa de força, um congelamento das responsabilidades do governo. Para um tecnocrata de Brasília é fácil. Vocês que estão perto do povo, sendo cobrados, sabem as consequências dessas medidas.

Então, tem muito deputado, senador que em 2007 fez festa quando impediu a CPMF. “Derrotamos o Lula.” Não derrotaram o Lula, tiraram 24 bilhões, isso naquela época, que iam para a saúde pública. Depois os deputados se elegem prefeitos e governadores e vem a falta que faz esse dinheiro para a saúde. Em 2015, com a Dilma, a mesma coisa. Muita gente comemorando pauta bomba, o pato amarelo. Agora uma crise fiscal imensa e todo mundo pagando o pato, que se tivessem criado a CPMF em 2015 provavelmente não estaríamos nesse sufoco hoje. Então, independente de quem seja eleito, independente de que partido, precisamos rever o teto de gastos e a estrutura tributária do Brasil. Porque podem ver que os países ricos, com serviços públicos de qualidade, tem carga tributária em geral maior que a nossa. E lá a renda média é maior, ou seja, os gastos públicos são muito maiores.

  1. Educação: Os Municípios são responsáveis pela oferta da educação infantil, que passou a ter, desde 2016, a pré-escola como obrigatória, e têm como meta atender ao menos 50% da faixa etária de creches até 2024. Para atender essa imposição são necessárias cerca de mais 500 mil matrículas na pré-escola e 2,2 milhões de matrículas na creche. O custo, especialmente da creche, é notadamente maior do que o valor por aluno recebido do Fundeb e as matrículas só aumentam nessa faixa de ensino, enquanto nas demais, diminuem. Isto deve gerar um rombo nas contas municipais de mais R$ 21 bilhões ao ano e, dessa forma, entendemos que apenas na construção de um novo Fundeb poderemos equalizar essa conta. O seu governo pretende priorizar a educação básica, construindo um novo mecanismo de financiamento que atenda as crescentes demandas municipais?

Vamos precisar rediscutir os repasses por faixa etária e o financiamento das novas necessidades da educação básica. O país tem uma agenda que aparece nessas perguntas dos prefeitos que não está presente no debate de cortes, cortes, cortes do governo atual. Irá custar fazer e dar a educação básica que nossas crianças merecem, mas quanto irá custar ao país não fazer isso? Quanto custa não fazer e sacrificar o nosso futuro? E de novo o teto de gastos. O Brasil rumava para a meta de investir 10% do PIB em educação, de acordo com o plano nacional da área, e o fundo do pré-sal, prioritariamente, é para a educação. Inventaram que o pré-sal era uma ficção, teve procurador do Tribunal de Contas da União que deu entrevista em revista da Globo dizendo que o pré-sal era inviável. Tem texto da Míriam Leitão, do Carlos Sardenberg na época do meu governo dizendo que o pré-sal era coisa da imaginação. Pois bem. O pré-sal já está tirando mais de 1 milhão e 700 mil barris de petróleo por dia e esse número só vai crescer. Isso irá tudo para o bolso das empresas estrangeiras e o petróleo vai sair do oceano e o dinheiro vai direto para contas bancárias no exterior, ou parte irá ficar para financiar a educação dos brasileiros, como sonhamos e colocamos em lei?

  1. Saneamento

Saneamento básico é um problema de saúde pública sob responsabilidade dos Municípios, no que diz respeito à cobertura de tratamento de esgoto, de coleta de lixo e de abastecimento de água. O custo para universalizar esses serviços ultrapassa os R$ 300 bilhões, o que levaria mais de 100 anos no atual ritmo de investimentos. Ademais, encerrar os lixões é hoje uma das exigências em que os prefeitos mais estão sendo criminalizados. Qual a política do seu governo para apoiar os Municípios no processo de encerrar os lixões no Brasil? Quais políticas públicas serão implementadas para a área de saneamento no seu governo?

Estamos estudando, com cautela, porque a recente subida do dólar mostra a importância dessas reservas cambiais constituídas durante os governos do PT, mas estamos avaliando a possibilidade do uso de parte dessas reservas para financiar obras de infraestrutura que gerem empregos. E obras de saneamento são uma necessidade de saúde pública e também são importantes porque podem movimentar a economia e melhorar o meio ambiente. Os rios do nosso país são importantes para o consumo nas cidades, para geração de energia e agricultura.

Precisamos avançar no financiamento e implantação da reciclagem e destinação correta do lixo. É necessário discutir o cumprimento da lei que encerra os lixões. Temos que buscar soluções dentro da lei, ambientalmente corretas e que gerem empregos a partir dos resíduos recicláveis e orgânicos, reduzindo ao máximo o problema causado pelo lixo.