O seminário “Métodos de Gestão e os Impactos na Saúde do Trabalho”, realizado na semana passada, em Curitiba, contou com a presença de representantes dos trabalhadores, da academia e de operadores do direito para debater a forma como o gerenciamento das empresas acarreta prejuízos na vida dos seus empregados.

O Instituto de Defesa da Classe Trabalhadora (Declatra) desenvolveu, em parceria com o Sindicato dos Bancários de Curitiba e região, uma pesquisa nesta área que resultou no movimento “Vítimas do HSBC”. Foram dois anos de pesquisa com uma equipe multidisciplinar e a investigação de dados relacionados às homologações de desligamentos de trabalhadores, processos trabalhistas contra o banco e dados do Ministério da Saúde e da Previdência Social. A conclusão foi de que os métodos de gestão da instituição financeira resultavam em assédio moral organizacional e consequentemente ao adoecimento dos seus trabalhadores.

O estudo foi tema de uma mesa durante o evento. A advogada do Declatra e uma das responsáveis pela pesquisa, Jane Salvador de Bueno Gizzi, destacou as diferenças entre o assédio moral perverso, que acontece entre pessoas e o assédio moral organizacional, que segundo ela é mais amplo.

“Esta segunda modalidade responsabiliza o dono do capital, do empreendimento, neste caso específico do banco”, explica. A advogada relata esta caracterização é importante para que o verdadeiro culpado pela situação não fique impune. “Ele centra-se no exercício do poder patronal. É aquele assédio cujas práticas e políticas de gestão são usadas, de forma abusiva, com vistas em obter o lucro. São três pilares essenciais: imposição de metas, cobranças abusivas e pressões”, exemplificou a advogada.

Jane também enfatizou a forma como há alienação do trabalhador quanto à sua função no ambiente de trabalho e mais do que isso: ele é reduzido a uma mercadoria. “O empregado diz ser colaborador. É usurpada dele a condição legítima de empregado e introjeta-se que ele está em uma situação de paridade ou próximo do seu empregador. Ele passa a ser responsável pelos lucros da empresa”, comenta.

A pesquisadora do Instituto Declatra, Paula Cozero, fez um relato sobre os dados específicos obtidos com a pesquisa. Entre os indicadores destacados estavam que das 1.587 pesquisadas, mais da metade apontavam para métodos assediosos de gestão e que destas 893 pediam restituição por danos morais. “Quase 60% eram mulheres e 32% dos bancários trabalhavam no telebanco. Outro dado é que quanto mais tempo de banco maior é a tendência de ter sofrido problemas que resultavam em danos morais”, relatou Paula. De acordo com ela, como trata-se de um problema coletivo, a saída também deve ser coletiva. “Queremos que esses dados sejam usados pelos sindicatos e trabalhadores. É um desafio grande convencer as pessoas de que estas práticas não podem acontecer para depois lutar contra isso”, completou.

ContrafA ContrafCUT também participou do evento com uma apresentação dos princípios que norteiam as políticas de saúde do trabalhador no Brasil, enfatizando que se trata de um Direito Humano Fundamental, que a saúde é um bem indisponível, logo, os bancos não podem fazer o que bem entendem com a saúde dos seus empregados. “O evento foi de excelente qualidade e muito útil para o enfrentamento que temos que fazer, para defender a saúde dos trabalhadores, diante da violência praticada pelos bancos cotidianamente”, afirmou Walcir Previtale, secretário de Saúde do Trabalhador da Contraf-CUT.

Ele lembra que foram discutidos ainda que os bancos devem cumprir por completo as Convenções da OIT ratificadas pelo Brasil e que a Fenaban deveria reforçar e cobrar de seus representados (os bancos) essas políticas e não atacá-las. “A exemplo do que fez na mesa de negociação da campanha nacional, quando a pauta estabelecida foi sobre saúde e condições de trabalho”, recordou.

Exemplo gaúcho
Na sequência, a assessora de Saúde do Sindicato dos Bancários do Rio Grande do Sul, Jaceia Netz, falou sobre a pesquisa realizada pelos gaúchos que tratou da saúde mental da categoria local. De acordo com ela, a pesquisa foi realizada com 83% dos entrevistados de bancos públicos e apenas 17% das instituições privadas, o que segundo ela, já demonstra “a questão da democracia no local de trabalho”.

Jaceia também enfatizou a forma como os bancários gaúchos percebem o seu ambiente. “No contexto do trabalho 60% percebem que as condições são críticas ou graves, 75% têm percepções negativas das relações de trabalho e 96% avaliam a organização de trabalho como crítica ou grave”.

Os indicadores apresentados por Jaceia também tem uma intrínseca ligação com os métodos de gestão assediosos que complicam a vida e a saúde do trabalhador que, muitas vezes, precisa passar por cima de suas próprias convicções. “Nossa pesquisa mostrou que 49% dos entrevistados disseram abrir mão dos seus conceitos éticos em virtude das suas atividades profissionais”, completou.

O advogado gaúcho e ex-presidente da Associação dos Advogados Trabalhistas do estado, Antônio Vicente Martins, ressaltou que ambas as pesquisas demonstraram cientificamente as percepções individuais. “‘Temos a percepção no atendimento individualizado ao bancário e à bancária. Mas quando há esse conhecimento com uma pesquisa vemos que nossa percepção é verdadeira”, comentou.

O presidente do Instituto Declatra, Mauro Auche, por sua vez destacou a importância das redes neste processo. O fato da pesquisa paranaense ter resultado no “Movimento Vítimas do HSBC” está surtindo resultados. “Recebemos diversos contatos de pessoas em situações semelhantes querendo participar. Precisamos divulgar estas ações em nossas redes para que elas sejam potencializadas, para que mais pessoas saibam. Vamos lembrar também que muitos das cláusulas presentes hoje na convenção coletiva dos bancários surgiram de iniciativas semelhantes a esta do Paraná e a do Rio Grande do Sul”, exemplificou.

Fonte: Contraf-CUT, com Seeb Curitiba