A cada três segundos uma pessoa atenta contra a própria vida no mundo, de acordo com a OMS. Pesquisadora destaca o quanto é nocivo a falta de diálogo e solidariedade diante do tema
Em entrevista para a Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae), a pesquisadora e psicóloga do trabalho, Dra. Fernanda Souza Duarte, alerta para a importância da campanha “ Setembro Amarelo”, não só como ações de prevenção ao suicídio, mas também como desmistificar alguns equívocos relacionados à problemática. A psicóloga também enfatiza o quanto é nociva a falta de diálogo e de solidariedade para abordar esse tema e isso pode acarretar efeitos não só em nossas vidas, mas também na esfera política e social.
“É importante a campanha para trazer conscientização sobre o tema. O suicídio ainda é um assunto considerado tabu, assim como alguns transtornos mentais associados. É importante dizer que nem todo suicídio é vinculado a transtornos mentais, mas de qualquer forma a campanha traz também a possibilidade de ampliar a discussão para problemas como depressão, ansiedade e outros transtornos”, afirmou Fernanda. Ouça aqui.
Segundo a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), que é o escritório regional da Organização Mundial da Saúde (OMS) para as Américas, cerca de 800 mil pessoas morrem por suicídio todos os anos, taxa de 11,4 mortes para cada grupo de 100 mil habitantes, sendo que 79% dos suicídios no mundo ocorrem em países de baixa e média renda.
Segundo o relatório divulgado pela OMS, a cada três segundos uma pessoa atenta contra a própria vida no mundo. De acordo com o relatório, o suicídio deve ser tratado como um problema de saúde pública, mas não é tratado e prevenido de maneira eficaz.
O Brasil é o oitavo país em número de suicídios. Em 2012, foram registradas 11.821 mortes, sendo 9.198 homens e 2.623 mulheres (taxa de 6,0 para cada grupo de 100 mil habitantes). Entre 2000 e 2012, houve um aumento de 10,4% na quantidade de mortes – alta de 17,8% entre mulheres e 8,2% entre os homens.
Saúde Pública
De acordo com a pesquisadora, é de extrema importância ressaltar que o suicídio é uma questão de saúde pública. “A última informação que eu tive é que ela não é reconhecida em âmbito nacional, alguns estados reconhecem, outros não. Entender o suicídio enquanto um problema de saúde pública, um problema de saúde coletiva é fundamental para que possamos pensar em ações que previna o suicídio”, enfatizou.
Para a psicóloga, um ponto comum entre os especialistas e estudiosos no assunto, as relações sociais configuram uma variável importantíssima para entender o suicídio e têm impacto significativo sobre a saúde das pessoas.
Um exemplo disso é o impacto que a pandemia do coronavírus tem causado em relação a doenças mentais e mudanças de comportamentos, que podem ser diagnosticados e tratados.
Incertezas e vulnerabilidade impactam a saúde mental
“A gente está falando de um país onde o número de desempregados aumentou muito durante a pandemia. Então todos estes fatores são multicausais, onde devemos levar em conta não só as questões psíquicas, mas também as questões econômicas, sociais e culturais. Esse momento de desemprego é ruim, não só para quem perde o emprego, mas também para quem continua com o emprego observando este panorama. Querendo ou não, para quem trabalha com vínculo de contrato, o poder dessa ameaça aumenta, onde a perda do emprego é uma realidade muito presente. Então, todas essas coisas deterioram a saúde das pessoas”, disse Fernanda, e ainda enfatizou que a pandemia da Covid-19 exige das pessoas um distanciamento físico, com mudanças no comportamento de como nos relacionávamos. Para ela, todas as incertezas revelam que não estamos num melhor momento em termos de saúde mental.
Fernanda apontou que muitas pessoas estão passando fome no Brasil neste momento, e são condições que deterioram a saúde mental. Para a psicóloga, incertezas e vulnerabilidade impactam as pessoas de formas distintas, com experiências subjetivas de sofrimento. “Embora pareça óbvio, não se tem um consenso que sobre as questões de saúde mental. É preciso questionar sobre como falar em promover saúde mental, sem comida na mesa, o que torna um momento desfavorável em relação à condição de saúde mental. A deterioração deste modelo social com um modelo novo de trabalho, que requer a mediação de tecnologias da informação, faz com que muitos se distanciem do momento do cafezinho, de interagir, o que para algumas pessoas é um momento muito importante, onde elas constroem mais relações sociais. Não podemos deixar de citar também as pessoas que perderam o emprego, que não se sentem inseridas e se sentem incapazes de dar um sustento para suas famílias”, ressaltou.
Mitos – Falta de conhecimento, diálogo e solidariedade
Segundo a pesquisadora tem muitos mitos relacionados ao suicídio. Um dele é o famoso: ‘Só quer chamar atenção’. “Não podemos ver isso com menosprezo. Nos casos próximos, é importante construir relações de solidariedade, sem julgamento. É fundamental trabalhar na construção de diálogos. Cada dia a gente percebe mais o quanto é nocivo a falta de diálogo e de solidariedade. E isso pode acarretar efeitos não só em nossas vidas, mas também na esfera política e social. As boas intenções podem ser desastrosas. É recomendável conhecer os serviços de saúde, como se dá o acesso até eles, e recomendar esses serviços”, concluiu.
Fonte: Feane