As autoridades americanas vieram participar da reunião de ministros da economia do Grupo de 20 países com a esperança de persuadir outras nações a adotar mais estímulos fiscais, mas acabaram deixando a conferência sob inesperada pressão para consertar o frágil setor bancário dos EUA.

Depois dos cordiais apertos de mão e fotografias em grupo, o secretário do Tesouro dos EUA, Timothy Geithner, voltou apressadamente para Washington num jato militar, para iniciar o frenético período de 17 dias antes da segunda reunião do G-20, em Londres, que contará com a presença do presidente americano Barack Obama e de outros líderes mundiais.

Os acontecimentos no Reino Unido indicam quais são os limites do poder americano no mundo que surge dos escombros da crise financeira. Muitos países, inclusive aliados americanos, estão pressionando cada vez mais os EUA para limpar a bagunça que acreditam ter sido criada pelo país.

As medidas de Geithner nas próximas duas semanas serão analisadas à exaustão por Wall Street e pelos mercados financeiros mundiais, que continuam pouco confiantes de que o governo Obama vá tirar o mundo da recessão.

"É natural que o mundo espere liderança da parte dos EUA em qualquer conferência internacional de peso", disse Daniel Price, sócio responsável por questões mundiais na firma de advocacia Sidley Austin. Ele também já foi o principal assessor para questões financeiras internacionais do presidente americano anterior, George W. Bush. "No momento é grande a expectativa para que os EUA criem um plano ambicioso para resgatar os bancos e estabelecer uma agenda mais ampla e detalhada para a reforma das instituições de fiscalização do sistema."

Geithner planeja divulgar antes da conferência os detalhes das duas principais armas do governo para acalmar os mercados financeiros: sua proposta de parceria com o setor privado para comprar ativos podres e o plano para reformar a estrutura de supervisão dos bancos.

Na reunião do G-20, realizada nos arredores de Londres, ministros da fazenda e presidentes de bancos centrais concordaram em lançar políticas fiscal e monetária expansionistas "até que o crescimento seja restaurado", mas não chegaram a endossar uma meta específica para o estímulo – cerca de 2% do PIB – sugerida semana passada pelas autoridades americanas.

Os participantes também concordaram com uma série de medidas para aumentar o socorro a países em desenvolvimento, envolvendo incrementos nas reservas do FMI e outras ações para melhorar a regulamentação financeira, como a exigência de registrar apropriadamente fundos de hedge e seus administradores.

Os participantes disseram que a unidade de propósitos na reunião foi uma surpresa agradável diante dos comentários feitos antes por alemães e franceses rebatendo a reivindicação dos americanos de mais compromisso com a expansão fiscal. Mas também ficou claro que as autoridades americanas ainda têm muita estrada pela frente antes de conseguir apagar a preocupação com o setor bancário, que surgiu como um surpreendente ponto de discórdia durante as negociações.

"Eu e alguns outros esperávamos uma ação bem mais rápida por parte do governo (dos EUA)" em relação ao tratamento aos bancos, disse um banqueiro central.

Geithner deve divulgar esta semana mais detalhes de seu polêmico plano para criar uma parceria entre o governo e investidores para comprar os ativos podres que oneram o balanço dos bancos. Esse plano pode tentar retirar do setor bancário de US$ 500 bilhões a US$ 1 trilhão em ativos problemáticos.

Poucos dias antes de divulgar esses detalhes, Geithner deve divulgar um plano separado para reformar o sistema de regulamentação dos mercados financeiros, cuja lassidão, acusam os críticos, permitiu que vários conglomerados financeiros se enfraquecessem e, em alguns casos, até quebrassem, derrubando as bolsas mundiais.

As autoridades do Tesouro vêm trabalhando há semanas no plano para reformar a supervisão dos mercados financeiros, junto com autoridades do alto escalão do Federal Reserve, o banco central americano. O plano deve sugerir um meio de fiscalizar mais efetivamente o risco nos mercados, um papel que Geithner sugeriu semana passada poder ser desempenhado melhor pelo próprio Fed.

O plano também deve recomendar a criação de um mecanismo para liquidar grandes empresas do setor financeiro que não são garantidas pela agência federal de seguro-depósito dos EUA, a FDIC, assim como resolver conflitos no sistema de bônus que ameacem a estabilidade das empresas, e endurecer a legislação de proteção ao consumidor.

Espera-se que uma parte importante do novo plano sejam maiores exigências de reserva de capital para grandes bancos, para coibir o risco excessivo e aumentar suas reservas. Geithner tem reclamado que a atual estrutura de capital permite que os bancos diminuam suas reservas quando há bonança, deixando-os numa posição difícil quando os prejuízos aparecem.

O G-20 descartou aumentar as exigências de reserva de capital dos bancos até que a recuperação econômica comece a ocorrer.

Os aliados dos EUA aumentaram a pressão durante o fim de semana para o país escorar seu combalido sistema bancário. "Alguns países não consertaram seus bancos, então eu gostaria que eles sanassem seus bancos", disse o ministro das Finanças do Canadá, Jim Flaherty, numa aparente referência velada aos EUA.

O ministro das Finanças da Alemanha, Peer Steinbrück, fez declaração parecida que pareceu retrucar aos pedidos dos EUA para mais estímulo fiscal no mundo.

"Estamos convencidos de que não faz sentido injetar mais e mais dinheiro em nossa economia quando ainda não conseguimos restaurar a confiança nos mercados financeiros", disse a repórteres durante uma pouco habitual entrevista conjunta com autoridades francesas. O evento foi um indício de que os dois países adotaram uma posição similar com respeito às demandas americanas por mais estímulo fiscal.

Fonte: Valor Econômico / Damian Paletta e Stephen Fidler, The Wall Street Journal, de Horsham, Reino Unido