A crise global já criou 38 milhões de desempregados, precisa ser combatida com coragem e os EUA, que geraram o problema, têm a maior responsabilidade para tirar o mundo da recessão.

É com essa mensagem que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva participa hoje da reunião de cúpula do G-20, que emerge como o diretório da economia internacional e reforça a ambição do país de estar no centro das decisões globais.

Embora cobrando duro, Lula visivelmente reduziu as expectativas sobre os resultados de hoje. Disse que a reunião "não será fácil", por causa de divergências entre os países. E avisou que o Brasil participará com a "convicção de que tem lições a dar" sobre como superar a mais dramática recessão dos últimos tempos.

"Estamos fazendo tudo que está ao nosso alcance para facilitar aqueles que querem produzir, comprar, vender. É essa lógica que queremos estabelecer no mundo", disse ele em entrevista no trem entre Paris e Londres.

Para Lula, se o G-20 "brecar a crise nos países ricos, já está bom".

O presidente "afinou a orquestra" com o presidente francês Nicolas Sarkozy, para cobrar medidas concretas e decisivas para combater a crise e para reformar o sistema financeiro internacional.

Sarkozy logo depois deu entrevista em Londres com a chanceler alemã, Angela Merkel, onde os dois ameaçaram não assinar o comunicado final hoje do G-20 se não houver medidas firmes para tirar o mundo da recessão.

Ao receber pouco antes Lula no palácio presidencial, Sarkozy disse que a "identidade é total e completa" entre o Brasil e a França hoje, para exigir "um mínimo de regulação do sistema financeiro, considerando o desastre que representa essa terrível crise".

Lula disse que não quer com Sarkozy assumir a responsabilidade de "fazer uma reunião fracassada, em que a decisão seja marcar nova reunião", mas fez uma nuance: "Não se faz uma negociação com o pé na parede, ou dá ou desce".

Lula, Sarkozy e Merkel prepararam o terreno para se declararem vitoriosos, porque, de toda maneira, algo sairá do encontro de hoje, a começar pela decisão de controlar todas as instituições financeiras, desde hedge funds (fundos especulativos) como também os paraísos fiscais.

Sarkozy em entrevistas identificou a China como o principal obstáculo para um acordo sobre a regulação financeira, porque Pequim não aceita uma lista negra desses centros financeiros de zonas cinzentas. Haverá um acordo para quebrar o segredo nos paraísos, mas não sobre como puni-los, conforme fontes em Londres.

Sem mencionar a China, o presidente Lula foi incisivo: "É preciso controle dos paraísos fiscais, que terminam por esconder o crime organizado, narcotráfico, lavagem de dinheiro".

"Vocês percebem que será uma reunião entre amigos, mas difícil e nem todos os amigos estão pensando igual neste momento. Estão pensando só em seu país. Mas temos também a responsabilidade de pensar na sociedade global", disse Lula, sem apontar países.

Enquanto está firme com a França sobre a regulação bancária, o Brasil admite que medidas de estímulo para a economia global serão tímidas em relação ao que esperava justamente com os EUA.

A expectativa brasileira é de que o G-20 tome decisão que dê um alento às pessoas de que o consumo será retomado e o emprego recuperado. Embora sempre cobrando dos EUA, Lula observou que sua preocupação é, sobretudo, achar solução.

"Se encontrei um cidadão moribundo, baleado, não vou ficar perguntando quem deu o tiro e onde está a bala, mas levar a vítima ao hospital para salvá-la. A economia mundial está moribunda, e sabemos porque está assim."

"Todo mundo já sabe o que tem de ser feito. Não existe mais segredo. É apenas assumir as responsabilidades. Vamos ter de restabelecer o crédito no mundo e somente com isso vamos restabelecer a confiança dos consumidores para fazer girar outra vez a economia. Na parte econômica, certamente nossos técnicos saberão resolver. Mas é preciso que nós apontemos o rumo das decisões políticas".

"Espero que a gente não tenha medo de tomar decisões. O medo é que causou a crise, pois houve medo de agir em setembro de 2007."

Para o presidente, é a primeira vez que "sentamos em igualdade de condições". Para o chanceler Celso Amorim, o G-8, que era centro decisório da economia mundial, "não mais vai ter condições de ter diálogo sobre nenhum tema relevante no mundo" sem a presença dos emergentes como Brasil.

Fonte: Valor Econômico / Assis Moreira, de Londres