O Banco do Brasil leva, com a aquisição de metade do capital do Banco Votorantim, uma carteira de financiamentos de veículos composta basicamente de operações com usados. Esse foi um dos pontos mais questionados por investidores e analistas econômicos ontem em teleconferência do BB. Eles queriam saber quais são os riscos de perdas em um contexto de forte queda nos preços dos carros usados.

Segundo informação do Votorantim, mais de 95% de sua carteira de financiamento de veículos, que somava R$ 16,8 bilhões em setembro, é de veículos usados. Desde que o país começou a sofrer mais intensamente os efeitos da crise financeira mundial, em setembro, os preços dos carros usados já tiveram uma retração superior a 20%.

A entrada do BB no segmento de financiamento de veículos usados está em linha com o interesse do governo em manter o crescimento da economia. Ontem, o presidente Lula disse em São Paulo que a compra do Votorantim ajudará a impulsionar o mercado de veículos novos, porque antes de comprar um novo os consumidores vendem seus carros usados. "O Banco do Brasil vai se preparar para financiar carros usados para que a roda da economia possa continuar girando normalmente", disse Lula.

Na teleconferência, Marcelo Vives, do Votorantim, ponderou que a inadimplência na carteira de veículos é baixa e que esse é um segmento com altas margens. Segundo ele, a taxa de inadimplência da carteira é de 3%, abaixo da média de mercado, que é de 4%. No cenário mais pessimista, disse, a inadimplência subiria para 4% neste ano. A taxa média de juros da carteira é de 2,1% ao mês, e seu prazo médio, 18 meses. Alguns analistas perguntaram se as projeções não eram muito otimistas. Os executivos do Votorantim e do BB disseram que não prevêem contração da atividade e do emprego tão severa como a dos EUA. A visão dos dois bancos é que crise abriu oportunidades para o banco avançar no financiamento de novos.

Antes da crise, o Votorantim exigia entrada equivalente a 30% do carro financiado. Nos casos em que é necessário retomar o carro para executar as garantias, informou Vives, o banco recupera em média 60% do valor do financiamento. Com a queda de 20% no preço dos carros usados, os cálculos são de que as garantias vão cobrir 50% do empréstimo. O Votorantim, após a crise, passou a exigir entrada maior dos clientes, de 40% do valor do automóvel, e encurtou o prazo dos empréstimos.

A avaliação é que, a despeito da queda dos preços dos veículos, a carteira de crédito é 100% garantida pelos automóveis. Para o Votorantim, a tendência é que os preços dos carros usados se recupere ao longo desse ano.

Na teleconferência, o vice-presidente de finanças do BB, Aldo Mendes, informou que os R$ 3 bilhões pagos na compra do Votorantim serão depositados em uma conta vinculada, podendo ser sacados em prazos de 6, 12 e 18 meses pelos atuais acionistas do banco. "Durante esse tempo, os recursos ficarão dando suporte ao ‘funding’ e ao caixa do banco."

Na sexta, na entrevista que divulgou a venda de metade do banco, o Votorantim negou que a estivesse atravessando problemas de falta de liquidez, como ocorre com instituições pequenas e médias. Balancete divulgado pelo BC, porém, registra queda de R$ 5,825 bilhões nos depósitos a prazo do Votorantim, que passou de R$ 22,457 bilhões em setembro para R$ 16,632 bilhões em outubro. Procurado pelo Valor, o Votorantim não quis comentar os números.

Os depósitos interfinanceiros, por outro lado, subiram de R$ 807 milhões para R$ 2,153 bilhões. O BC criou incentivo, liberando recursos dos depósitos compulsórios, para que bancos grandes fizessem depósitos interfinanceiros nos menores. A carteira de crédito da BV Financeira, que opera com financiamentos de veículos, caiu R$ 1,342 bilhão, passando de R$ 19,176 bilhões para R$ 17,834 bilhões entre setembro e outubro. O BC também incentivou bancos grandes a comprar carteiras de crédito de bancos menores.

O BB confirmou que poderá fazer captações no mercado financeiro para reforçar sua base de capital. O índice de Basiléia do banco, após a aquisição da Nossa Caixa e do Votorantim, fechou em 12,5% em dezembro, perto do mínimo, de 11%. O BB sustentou, na teleconferência, que o capital é suficiente para sustentar a expansão de 20% na carteira de crédito prevista para este ano. Mas, segundo seus executivos, a instituição poderá fazer captação de dívida subordinada ou em instrumentos híbridos de capital e dívida para ampliar o chamado capital Nível 2. O índice de Basiléia Nível 1 chegou a 8%, e o BB descartou fazer uma emissão primária de ações para ampliá-lo. Nesse caso, a opção seria a maior retenção de resultados do banco.

O BB disse que os ganhos de sinergia com a compra são pequenos, porque não haverá incorporação. Mendes prevê queda no custo de captação do Votorantim, hoje de 103% do CDI. O BB poderá abrir linha de financiamento ao banco, e a percepção de risco do Votorantim deverá cair após a operação.

Fonte: Valor Econômico / Alex Ribeiro