O Banco Central iniciou uma temporada de caça aos devedores e vai cobrar na Justiça as dívidas que os bancos Nacional e Econômico assumiram quando foi instituído o Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (Proer), entre 1995 e 1998, e que até hoje não foram quitadas. Ao todo, o Nacional vai sofrer uma ação de R$ 33,3 bilhões. O Econômico vai ser cobrado em R$ 29,1 bilhões. Somadas, as duas ações vão envolver mais de R$ 62 bilhões.

As ações serão ajuizadas contra as pessoas jurídicas dos bancos. Mas, no curso do processo, a cobrança pode alcançar os antigos controladores das instituições.

As cobranças estarão entre as maiores ações em tramitação na Justiça brasileira. No Supremo Tribunal Federal há apenas duas causas com valores superiores: a discussão sobre as perdas decorrentes de planos econômicos, que atinge R$ 105,9 bilhões, segundo o BC, e o processo em que se discute a cobrança de ICMS na base de cálculo da Cofins e envolve R$ 76 bilhões.

Assim que as ações contra o Nacional e o Econômico chegarem à Justiça, o que deve acontecer neste mês, o valor da dívida ativa do BC que, hoje, está em R$ 35 bilhões vai passar para R$ 85 bilhões.

Esse acréscimo de R$ 50 bilhões na dívida ativa, que representa todas as cobranças que o BC faz sobre os seus devedores, será o maior da história do banco. A Procuradoria do BC já separou uma parte dos débitos e inscreveu R$ 12 bilhões do Nacional e do Econômico na dívida.

As negociações com os dois bancos terminaram, após dezenas de reuniões que foram realizadas desde o ano passado entre representantes dos dois bancos e a Procuradoria-Geral do BC, nas quais não se chegou a um acordo sobre a melhor forma de pagamento.

O maior problema nas negociações foi a insistência das duas instituições em quitar as suas dívidas com um título que o BC não aceita – o Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS). Os dois bancos têm razões práticas para utilizar esse título. O Nacional tem R$ 28,8 bilhões em FCVS e o Econômico, R$ 6,7 bilhões.

O BC não aceita FCVS porque o título não tem liquidez no mercado. Para a instituição, o FCVS traz apenas uma expectativa de crédito, mas não dá segurança de que o valor será pago de fato.

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"O que o Nacional e o Econômico estão fazendo é protelar, com argumentos jurídicos vazios, o pagamento de suas dívidas ao BC e isso nós não vamos admitir mais", afirmou ao Valor o procurador-geral do BC, Isaac Sidney. "Como eles estão recalcitrantes e insistem em oferecer FCVS, o caminho legal será o indeferimento dos pleitos do Nacional e do Econômico e a cobrança judicial de suas dívidas de maneira integral, sem qualquer desconto", completou.

O desconto a que o procurador-geral se refere é grande. Ele foi concedido pela Lei nº 12.249. Conhecida como Refis dos bancos, essa lei foi sancionada, em junho de 2010, pelo então presidente Lula e permitiu o pagamento pelos bancos de dívidas contraídas na época do Proer com descontos de até 45% sobre os juros, à vista ou em parcelas de até 15 anos.

No caso do Nacional, o Refis dos bancos reduziu a dívida dos R$ 31,7 bilhões iniciais para R$ 22,2 bilhões. No caso do Econômico, a redução seria de R$ 27,2 bilhões para R$ 18,8 bilhões. Mas, só têm direito aos descontos os bancos que aceitarem os critérios do BC. Como insistiram com a entrega de FCVS ao BC, a cobrança será feita em valores anteriores à concessão de descontos pelo Refis dos bancos.

A situação dos demais bancos devedores do Proer está encaminhada. O Bamerindus concordou com o BC e está pagando a sua dívida de R$ 2,5 bilhões de maneira parcelada. São cotas mensais de R$ 14 milhões, que serão pagas durante 15 anos.

O Mercantil de Pernambuco concordou em pagar 100% de suas dívidas. Esse banco negociou com títulos aceitos pelo BC, como LFTs, NTNs-A3, e quitou mais de R$ 1,5 bilhão à vista. O Banorte concordou em pagar e deverá fazê-lo nas próximas semanas para quitar a sua dívida de R$ 632 milhões.

Os problemas do BC com o Proer permaneceram apenas com os dois maiores devedores, o Nacional e o Econômico. No ano passado, eles tentaram incluir um artigo numa Medida Provisória para obrigar o BC a aceitar o pagamento de dívidas com FCVS. O artigo seria incluído como "contrabando" numa medida que tratava de outros assuntos – a MP nº 517, que dispõe sobre incentivos para usinas nucleares e renovação da Marinha Mercante. A presidente Dilma Rousseff foi alertada a respeito desse artigo e vetou-o.

Recentemente, o Palácio do Planalto foi informado pelo BC sobre a dificuldade em negociar as dívidas dos dois bancos e concordou com a cobrança na Justiça.

Fonte: Valor Econômico