A força da greve nacional dos bancários, que durou 23 dias e chegou a paralisar 12.140 agências e centros administrativos de bancos públicos e privados em todo país, arrancou importantes conquistas econômicas e sociais, dentre elas o vale-cultura. 

A nova conquista acontece após a aprovação e regulamentação da Lei nº 12.761/2012, criada pelo governo Dilma como forma de incentivar o acesso de milhões de trabalhadores aos eventos e bens culturais. Além da Contraf-CUT, federações e sindicatos, a negociação com a Fenaban contou com o envolvimento direto da ministra da Cultura, Marta Suplicy. 

“A gente quer comida, diversão e arte”

Durante a solenidade da assinatura da Convenção Coletiva de Trabalho 2013/2014, ocorrida na última sexta-feira (18), em São Paulo, o presidente da Contraf-CUT, Carlos Cordeiro, destacou a conquista do vale-cultura, que pela primeira vez faz parte de uma convenção coletiva de trabalho no Brasil. “Isso permitirá que mais trabalhadores tenham acesso à literatura, ao cinema, ao teatro, aos espetáculos de música, valorizando a cultura em todo o país. A gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte. A gente não quer só dinheiro, a gente quer inteiro e não pela metade”, disse ele parodiando a música dos Titãs.

A presidenta do Sindicato dos Bancários São Paulo, Juvandia Moreira, também ressaltou a importância do vale-cultura. “Essa cláusula, além de facilitar o acesso dos bancários, injetará mais de R$ 9 milhões por mês na cultura”, afirmou. 

A inclusão da cláusula de vale-cultura na convenção coletiva foi também destacada pelo presidente da Fenaban, Murilo Portugal, e pelo secretário de Fomento e Incentivo à Cultura do Ministério da Cultura, Henilton Menezes, que representou a ministra na cerimônia.

“A ministra Marta Suplicy queria estar aqui nesse evento importante para prestigiar a assinatura da primeira convenção que inclui o vale-cultura para o trabalhador brasileiro. Ela pediu pra dizer a vocês que a partir de agora ela tem certeza que o programa deu certo”, afirmou o secretário. 

“Vivemos num país em que pouca gente lê, em que 90% dos brasileiros nunca assistiram a um espetáculo de dança, onde 70% têm acesso a bens culturais apenas pela televisão, onde 80% nunca entraram numa sala de cinema. O programa vale-cultura do trabalhador tem o objetivo de acabar com essa exclusão cultural, abrindo a possibilidade de nós brasileiros termos acesso à cultura produzida neste país”, acrescentou Henilton Menezes.

Para a secretária de Políticas Sociais da Contraf-CUT, Andrea Vasconcellos, “mesmo que a cláusula do vale-cultura inclua neste primeiro momento apenas os bancários e as bancárias que ganham até 5 salários mínimos, trata-se de um novo tempo que se abre para milhares de bancários, que terão incentivo para o acesso aos eventos e bens culturais em todo país”. Com posse do cartão magnético, será possível comprar ou alugar CDs, DVDs, livros, revistas e jornais. 

“Vale ressaltar que essa conquista é fruto da luta dos bancários, através das suas entidades sindcais, que de forma guerreira e combativa construíram uma grande mobilização no país, fazendo a Fenaban ceder e garantir na convenção coletiva mais um direito para a categoria”, conclui Andrea.

Confira a íntegra da nova conquista na convenção coletiva:

CLÁUSULA 65ª – PROGRAMA DE CULTURA DO TRABALHADOR – VALE-CULTURA 

Os bancos concederão aos seus empregados, que percebem remuneração mensal até o limite de 5 (cinco) salários mínimos nacionais, aqui compreendido o salário-base acrescido das verbas fixas de natureza salarial, o Vale-Cultura instituído pela Lei n. 12.761, de 27/12/2012, regulamentado pelo Decreto n. 8.084, de 26/08/2013, IN MINC n. 02/2013, de 06/09/2013 e Portaria MINC n. 80, de 30/09/2013, no valor único mensal de R$ 50,00 (cinquenta reais), sob a forma de cartão magnético. 

Parágrafo Primeiro 

O fornecimento do vale-cultura depende de prévia aceitação pelo empregado e não tem natureza remuneratória, nos termos do art. 11 da Lei 12.761/2012. 

Parágrafo Segundo 

O empregado usuário do vale-cultura poderá ter descontados, de sua remuneração mensal, assim entendida como o salário-base acrescido das verbas fixas de natureza salarial, os seguintes percentuais sobre o valor do vale-cultura estabelecidos no art. 15 do Decreto n. 8.084, de 26/08/2013, como segue: 

I – até um salário mínimo – dois por cento; 
II – acima de um salário mínimo e até dois salários mínimos – quatro por cento; 
III – acima de dois salários mínimos e até três salários mínimos – seis por cento; 
IV – acima de três salários mínimos e até quatro salários mínimos – oito por cento; e 
V – acima de quatro salários mínimos e até cinco salários mínimos – dez por cento. 

Parágrafo Terceiro 

O salário mínimo a ser considerado, para efeito de desconto, é o valor correspondente ao salário mínimo nacional. 

Parágrafo Quarto 

Os bancos, nos termos da legislação citada no caput, providenciarão sua habilitação como “entidade beneficiária” do vale cultura, junto à Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura (SEFIC) do Ministério da Cultura. 

Parágrafo Quinto 

Ficam a critério do empregado, nos termos da legislação do Vale-Cultura, a forma e o momento de utilização dos créditos efetivados pelo banco, decorrentes do cumprimento desta cláusula. 

Parágrafo Sexto 

Esta cláusula vigorará no período de 01/01/2014 a 31/12/2016, salvo se antes desse prazo o incentivo fiscal previsto no art. 10 da Lei 12.761/2012 e nos artigos 21 e 22 do Decreto 8084/2013 for revogado, hipótese em que a concessão do benefício Vale-Cultura cessará imediatamente. 


Bancários: referência que se torna reverência

Além de valorizar a nova conquista, Andrea chama a atenção para a disputa dos sentidos e dos significados da produção cultural que está em curso no país. Para ela, “é urgente avançar na construção e na reconfiguração de uma política cultural de qualidade, que não passe somente pelo fortalecimento da ‘financeirização da cultura’ ou pelo registro fotográfico de desenhos de crianças pobres e negras dos projetos promovidos pelos bancos”. 

“Há que se promover outra ‘economia criativa’ com a riqueza de expressões que possui a cultura brasileira, que vai muito além do forró escrachado e vulgar, do marketing sonoro, da mercantilização do corpo feminino pela propaganda, da novela que fabrica falsos sonhos, do merchandising para o consumo”, ressalta Andrea. 

A diretora da Contraf-CUT avalia que “romper com o modelo predominante de rentabilidade da cultura implica por fim ao monopólio da TV aberta, à alta concentração das concessões dos meios de comunicações. Por exemplo, a Rede Globo mantém 45% da audiência, controla a distribuição de filmes nacionais no cinema, participa de 38 canais fechados (Net e SKY), controla também jornais e rádios, o que caracteriza a chamada propriedade cruzada”. Esse modelo só serve para fortalecer as redes nacionais e enfraquecer a produção local. 

“Com o vale-cultura, os bancários também assumem um papel importante: o de superar o vazio da cultura no Brasil, de construir novos paradigmas relacionados à arte. Para além da cultura, queremos o direito de acesso à arte e à literatura, ampliando os espaços de integração e inteiração social”, conclui Andrea.


Fonte: Contraf-CUT